segunda-feira, 7 de março de 2011

Os Delírios de Consumo de Becky Bloom - Capítulos 22 ao 24 (Últimos Capítulos)

VINTE E DOIS

Eu nasci para aparecer na televisão. Esta é a verdade. Definitivamente nasci para
aparecer na televisão.
Estamos sentados nos sofás novamente Rory, Emma e eu, enquanto Arme, da Leeds,
gagueja ao telefone admitindo que nunca na vida pediu restituição do imposto de renda.
Olho para Emma e sorrio, e ela pisca de volta. Faço parte da equipe. Sou uma do
grupo. Nunca me senti tão entusiasmada e feliz em toda a minha vida.
É realmente estranho que, quando era eu a entrevistada, estava toda tímida e nervosa
mas agora, que estou do outro lado do sofá, estou muito tranqüila. Deus, eu poderia fazer
isto o dia todo. Nem me importo mais com o brilho das luzes. Parecem normais. E já
ensaiei na frente do espelho o jeito mais bonito de sentar (joelhos juntos, pés cruzados no
calcanhar) — e estou me fixando nele.
— Comecei a fazer umas faxinas — diz Anne — e nunca analisei a situação. Mas
agora meu chefe me perguntou se eu paguei algum imposto. Quero dizer, isto nunca me
ocorreu.
— Ah, meu Deus — diz Emma, e olha para mim. — Anne obviamente está numa
enrascada.
— De modo algum — digo solidária. — Bem, a primeira coisa, Arme, é verificar se
você precisa pagar algum imposto, pois se estiver abaixo do teto, estará isenta. A segunda
coisa é que você ainda tem muito tempo para se organizar e dar entrada no pedido de
restituição.
Esta é a outra coisa realmente estranha. Deus sabe como — mas eu sei as respostas
para todas as perguntas. Entendo de hipotecas, de seguros de vida e de aposentadorias e
pensões. Entendo desse negócio! Alguns minutos atrás, Kennetb de St. Austell perguntou
qual é o limite de contribuição anual para o imposto ISA — e eu respondi 5.000 libras
sem nem pensar. E quase como se alguma parte da minha mente estivesse guardando
cuidadosamente cada pequena informação que eu nunca usei na Successful Saving, e,
agora que preciso, está tudo ali. Pergunte-me qualquer coisa! Pergunte-me... as regras
sobre taxa de ganhos de capital para donos de imóveis. Ande, pergunte-me.
— Se eu fosse você, Anne — finalizo — entraria em contato com o escritório da
Receita Federal mais próximo e pediria uma orientação. E não tenha medo!
— Obrigada — diz a voz estridente de Anne, — Muito obrigada, Rebecca.
— Bem, espero que isto ajude, Anne — diz Emma, e sorri para a câmera. — Agora
vamos para Danina para ouvir as notícias e a previsão do tempo, mas depois, como
muitas pessoas estão telefonando, voltaremos para este "ligue-agora" sobre o tema
"Administrando seu Dinheiro".
— Muitas pessoas com problemas de dinheiro — fala Rory.
— Demais — diz Emma. — E queremos ajudar. Portanto, qualquer que seja sua
dúvida, não importa se é grande ou pequena, por favor telefone para ouvir os conselhos
de Rebecca Bloom, no número 0333 4567. — Ela pára um instante, sorrindo para a
câmera, depois relaxa de volta na cadeira quando a luz apaga. — Bem, isto está indo
muito bem! — diz ela feliz, quando uma garota da maquiagem corre e retoca seu rosto
com pó. — Não está, Zelda?
— Fantástica! — diz Zelda, aparecendo da escuridão. —As linhas não estiveram tão
ocupadas desde quando fizemos "Eu gostaria de conhecer uma Spice Girl". — Ela olha
para mim com uma expressão de curiosidade. — Você já fez algum curso para saber
como se apresentar na televisão, Rebecca?
— Não — digo honestamente. — Não fiz. Mas... já vi muita televisão.
Zelda cai na gargalhada.
— Boa resposta! Tudo bem, pessoal, voltamos em trinta segundos.
Emma sorri para mim e consulta a folha de papel na frente dela, e Rory inclina-se para
trás e examina suas unhas. Eles estão me tratando como uma colega profissional, penso
feliz. Estão me tratando como um deles.
Nunca me senti tão completa e absolutamente feliz. Nunca. Nem quando achei um
bustiê Vivienne Westwood por 60 libras na liquidação da Harvey Nickols. (Por falar
nisso, estou tentando me lembrar onde ele está. Preciso usá-lo qualquer dia desses.) Isto
ganha de tudo mais. A vida é perfeita.
Inclino-me para trás, cheia de contentamento e estou olhando preguiçosamente em
volta no estúdio quando uma figura estranhamente familiar chama minha atenção. Olho
bem e minha pele começa a pinicar de pavor. Há um homem em pé na escuridão do
estúdio e, sinceramente, devo estar tendo uma alucinação ou algo assim, porque ele se
parece exatamente com...
— E... estamos de volta — diz Rory, e minha atenção volta para o cenário. — O
"ligue-agora" desta manhã é sobre problemas financeiros, grandes e pequenos. Nossa
especialista convidada é Rebecca Bloom e nosso próximo telespectador ao telefone é
Fran de Shrewsbury. Fran?
— Sim — diz Fran. — Olá. Olá, Rebecca.
— Olá, Fran. — Sorrio simpática. — E qual é o problema?
— Estou numa confusão — diz Fran. — Eu... eu não sei o que fazer.
— Você está devendo, Fran? — pergunta Emma gentilmente.
— Sim — responde Fran, e dá um suspiro trêmulo.
— Estourei o limite do meu cheque especial, devo dinheiro em todos os meus cartões
de crédito, peguei dinheiro emprestado da minha irmã... e simplesmente não consigo
parar de gastar. Eu simplesmente... adoro comprar coisas.
— Que tipo de coisas? — pergunta Rory interessado.
— Não sei exatamente — diz Fran após uma pausa. — Roupas para mim, roupas para
as crianças, coisas para a casa, só bobagem, na verdade. Depois as contas chegam... e eu
as jogo fora.
Emma me dirige um olhar significativo, e eu levanto minha sobrancelha em resposta.
— Rebecca? — diz ela. — Fran está obviamente com um problema. O que deveria
fazer?
— Bem, Fran — digo, amável. — A primeira coisa que precisa é ter coragem para
enfrentar seu problema. Entre em contato com o banco e diga-lhes que está tendo
problemas para administrar seu dinheiro. Eles não são monstros! Eles querem ajudar. —
Viro-me diretamente para a câmera e olho séria dentro das lentes. — Fugir não vai
resolver nada, Fran. Quanto mais tempo demorar, pior será.
— Eu sei — vem a voz titubeante de Fran. — Sei que está certa. Mas não é fácil.
— Eu sei — digo solidária. — Sei que não é. Masvocê vai saber resolver esta situação,
Fran.
— Rebecca — diz Emma. — Você diria que este é um problema comum?
— Temo que sim — respondo, virando-me de volta para ela. — Infelizmente, muitas
pessoas lá fora simplesmente não colocam a segurança financeira em primeiro lugar.
— Ah meu Deus — diz Emma, balançando a cabeça pesarosa. — Isto não é bom.
— Mas nunca é tarde demais — continuo. — Logo que eles enfrentam o problema,
acordam para suas responsabilidades, suas vidas se transformam.
Faço um gesto confiante de varredura com meu braço e, nessa hora, meu olhar abrange
todo o estúdio. E... Ah meu Deus, é ele.
Não é alucinação.
É ele mesmo. Em pé no canto do estúdio, usando um crachá de segurança e bebendo
alguma coisa numa xícara de plástico como se pertencesse a este lugar. Derek Smeath
está em pé aqui nos estúdios do Morning Coffee, a dez metros de mim.
Derek Smeath do Endwich Bank.
Mas não... não pode ser.
Mas é. E Derek Smeath. Não compreendo. O que está fazendo aqui?
Ah, Deus, e agora ele está olhando diretamente para mim.
Meu coração começa a bater acelerado, e eu engulo em seco, procurando manter meu
controle.
— Rebecca? — Emma diz, e me forço a voltar minha atenção para o programa. Nem
me lembro do que estão falando. — E então você acha que Fran deveria procurar o
gerente de seu banco?
— Eu... hã... sim — digo, meu rosto repentinamente queimando de vermelho.
O que vou fazer? Ele está olhando diretamente para mim. Não posso escapar.
— Então — diz Emma. — Você acha que, quando Fran encarar a realidade, será capaz
de organizar sua vida?
— Exatamente — concordo como um autômato e forço um sorriso radiante para
Emma. Mas, por dentro, minha felicidade confiante está evaporando. Derek Smeath está
aqui. Não posso expulsá-lo da minha vista, não consigo esquecer dele.
E agora todas as partes da minha vida, que eu tinha cuidadosamente enterrado no
fundo da minha mente, estão começando a aparecer. Não quero lembrar-me de nenhuma
delas mas não tenho escolha. Aqui vêm elas, insinuando-se para dentro da minha mente,
um pedaço de horrível realidade após o outro.
— Bem — diz Rory. — Vamos todos esperar que Fran siga o ótimo conselho de
Rebecca.
Meu desentendimento com Suze. Meu encontro desastroso com Tarquin. Uma sensação
fria horrível começa a correr pela minha coluna.
— Agora nosso próximo telespectador—diz Emma. — É John de Luton. John?
— Olá, Rebecca — vem uma voz pela linha. — O negócio é que recebi uma apólice de
seguro quando era criança, mas perdi todos os papéis. E agora gostaria de receber a
grana, entende o que quero dizer?
Meu cartão VISA, cancelado. Meu cartão Octagon, confiscado na frente daquela
multidão toda. Deus, aquilo foi humilhante.
Tudo bem, pare com isso. Concentre-se. Concentre-se.
— Este é na verdade um problema bastante comum — ouço-me dizer. — Você se
lembra com que empresa sua apólice estava?
— Não — diz John. — Não tenho a menor idéia.
Minha conta do banco. Milhares de libras de dívida. Derek Smeath.
Ah, Deus. Estou me sentindo mal. Quero correr e me esconder em algum lugar.
— Bem, você ainda deveria poder localizá-la — continuo, forçando-me a continuar
sorrindo. — Poderia começar por uma agência especializada neste tipo de coisa. Posso
verificar isto para você, mas acho que seu nome é...
Minha vida inteira horrível, desorganizada. Está tudo lá, não é? Esperando por mim,
como uma aranha enorme. Só esperando para atacar, tão logo este "ligue-agora" termine.
— Creio que já não temos mais tempo — diz Emma, quando termino. — Muito
obrigada à nossa especialista financeira, Rebecca Bloom, e tenho certeza de que todos
nós estaremos seguindo suas sábias palavras. Após o intervalo, os resultados da nossa
transformação em Newcastle e Heaven Sent 7, ao vivo, no estúdio.
Faz-se uma pausa gelada — depois todos relaxam.
— Certo — diz Emma, consultando sua folha de papel. — Onde estamos a seguir?
— Bom trabalho, Rebecca — diz Rory alegre. — Excelente matéria.
— Ah, Zelda! — diz Emma, levantando de um pulo. — Posso dar uma palavrinha com
você? Foi fabuloso, Rebecca — acrescenta. — Realmente fabuloso.
De repente os dois se foram. E sou deixada sozinha no cenário, exposta e vulnerável,
evitando desesperadamente os olhos de Derek Smeath e pensando o mais rápido que
posso.
Talvez eu possa escapar por trás sem ser vista.
Ou talvez eu possa ficar aqui no sofá. Só até que ele se canse e vá embora. Quero
dizer, ele não vai ousar entrar no cenário, vai?
Talvez eu possa fingir ser outra pessoa. Deus, sim. Quero dizer, com toda esta
maquiagem, eu praticamente pareço mesmo outra pessoa.
De qualquer modo — de repente me ocorre — quem vai dizer que ele me percebeu?
Ele está aqui provavelmente por alguma razão completamente diferente. Provavelmente
vai aparecer no programa ou algo assim. Exatamente. Nada a ver comigo. Portanto, vou
simplesmente levantar e passar por ele rapidamente e tudo ficará bem.
— Dá licença, meu bem — diz um homem de jeans, entrando no cenário. — Preciso
levar este sofá.
— Ah está bem — concordo levantando. Quando o faço, erradamente capto o olhar de
Derek Smeath de novo. Ele ainda está olhando diretamente para mim. Está me esperando.
Ah, Deus.
Tudo bem, tudo ficará bem — só continue andando. Só continue andando e finja que
não o reconhece.
Deliberadamente evitando seu olhar, levanto-me, respiro fundo e atravesso o cenário
com passadas rápidas. Meu passo não vacila; minha expressão não hesita. Meus olhos
estão fixos nas portas duplas, e estou indo bem. Agora só mais uns poucos passos. Só uns
poucos mais...
— Srta. Bloom. — Sua voz acerta minha cabeça como uma bala e por um instante
penso em ignorá-la. Penso até na possibilidade de pular para as portas. Mas Zelda e
Emma estão ali perto. Elas o ouviram chamar meu nome. Não posso escapar.
Portanto, me viro e dou o que considero ser uma segunda olhada muito convincente,
como que o reconhecendo pela primeira vez.
— Ah, olá, é você!— digo radiante. — Que surpresa. Como vai?
Um técnico gesticula para nós para falarmos baixo e Derek Smeath me conduz com
firmeza para fora do estúdio para um foyer. Ele se vira para mim e eu sorrio confiante.
Talvez possamos manter tudo num nível social.
— Srta. Bloom...
— Lindo dia hoje — digo. — Não acha?
— Srta. Bloom, nossa reunião — diz Derek Smeath, tenso.
Ah, Deus. Eu estava esperando que ele pudesse ter esquecido sobre isso.
— Nossa reunião — repito pensativa. — Erm... — E então tenho uma idéia repentina.
— Isto mesmo. É amanhã, não é? Estou esperando ansiosa.
Derek Smeath parece que vai explodir.
— Não é amanhã! Era na segunda-feira de manhã. E você não apareceu!
— Ah — digo. — Ah, aquela reunião. Sim, sinto muito. Pretendia ir, sinceramente. Só
que... Só que...
Mas não consigo pensar numa única desculpa sequer. Já usei todas elas. Assim, eu vou
murchando, mordo o lábio, sentindo-me como uma criança levada.
— Srta. Bloom — diz Derek Smeath aborrecido.
— Srta. Bloom... — Ele esfrega o rosto com a mão e depois olha para mim. — Você
sabe há quanto tempo estou escrevendo cartas para você? Sabe há quanto tempo estou
tentando levá-la ao Lanço para uma reunião?
— Hã... Não estou tem cer...
— Seis meses — diz Derek Smeath e pausa. — Seis longos meses de desculpas e
prevaricação. Agora, gostaria apenas que a senhorita pensasse o que isto significa para
mim. Significa cartas intermináveis. Inúmeros telefonemas. Horas de tempo e esforço de
minha parte e de minha assistente Erica. Recursos que, francamente, poderiam ser mais
bem despendidos em outra coisa. — Ele gesticula energicamente com sua xícara de
plástico e deixa cair um pouco de café no chão. — Depois, finalmente eu consigo forçá-la
a um encontro certo. Depois de tudo isto, penso que está levando sua situação a sério... E
você não aparece. Desaparece completamente. Telefono para sua casa e descubro para
onde você foi e sou acusado de modo muito desagradável de ser algum tipo de
perseguidor!
— Ah, sim — digo e faço uma expressão de pesar. — Desculpe-me quanto a isso. E só
meu pai, sabe. Ele é um pouco estranho.
— Eu nunca teria desistido de você — diz Derek Smeath, sua voz se elevando cada
vez mais. — Eu nunca teria desistido. E então estou passando por uma loja de televisores,
esta manhã, e o que vejo, em seis telas diferentes, se não a ausente, a desaparecida
Rebecca Bloom aconselhando a nação. E sobre o que está aconselhando? — Ele começa
a se sacudir de rir. (Pelo menos eu acho que está rindo.) — Finanças! Você está
aconselhando o público inglês... sobre finanças!
Olho para ele enfurecida. Não é tão engraçado assim.
— Olha, sinto muito por não ter podido comparecer na última reunião — digo
procurando soar profissional. — As coisas estavam um pouco difíceis para mim naquele
momento. Mas se pudermos remarcar...
— Remarcar! — grita Derek Smeath como se eu tivesse acabado de contar uma piada
histérica. — Remarcar!
Olho para ele indignada. Ele não está me levando nada a serio, está? Ele nem sequer
está ouvindo o que estou dizendo. Estou dizendo a ele que quero comparecer para uma
reunião — eu na verdade quero ir — e ele está me tratando como uma piada. Está me
tratando como alguma espécie de ato de comédia.
E não é para menos, interrompe uma vozinha dentro de mim. Olha a forma como você
se comportou até agora. Olha a maneira que o tem tratado. Francamente, surpreende
que ele ainda esteja sendo civilizado com você.
Olho para seu rosto, ainda enrugado de rir... e me sinto vencida.
Porque na verdade, ele poderia ter sido muito mais desagradável do que tem sido.
Poderia ter retirado meu cartão há muito tempo. Ou colocado a policia atrás de mim. Ou
me incluído na lista negra. Ele na verdade foi muito gentil comigo, de um jeito ou de
outro.
— Ouça — digo rapidamente. — Por favor. Me dê outra chance. Realmente quero
resolver minhas finanças. Quero pagar minha dívida com o banco. Mas preciso de você
para me ajudar. Estou... — Engulo. — Estou lhe pedindo para me ajudar, Sr. Smeath.
Há uma longa pausa. Derek Smeath procura em volta um lugar para depositar a xícara
de café, tira um lenço branco do bolso e esfrega-o nas sobrancelhas. Depois guarda-o e
me dirige um olhar demorado.
— Está falando sério? — diz ele finalmente.
— Sim.
— Vai realmente fazer um esforço?
— Sim. E . . . — Mordo meu lábio. — E sou muito grata por todas as chances que me
deu. Realmente sou.
De repente sinto que estou a ponto de quase chorar. Quero ser boa. Quero arrumar
minha vida. Quero que ele me diga o que fazer.
— Está bem — diz Derek Smeath finalmente. — Vamos ver o que podemos resolver.
Você vem ao escritório amanhã, às 9:30 em ponto, e vamos ter uma conversinha.
— Obrigada — digo, meu corpo todo relaxando aliviado. — Muito obrigada. Estarei
lá. Prometo.
— É bom estar — diz ele.— Não há mais desculpas. — Depois um sorriso pálido
passa pelo seu rosto. — Por falar nisso — acrescenta ele, apontando para o cenário. —
Achei que se saiu muito bem lá. Perfeitas todas as suas orientações.
— Ah — digo surpresa. — Bem... obrigada. É realmente... — Limpo minha garganta.
— Como você entrou no estúdio afinal? Pensei que tinham uma segurança bem eficiente.
— Eles têm — replica Derek Smeath. — Mas minha filha trabalha em televisão. —
Ele sorri amoroso. — Ela costumava trabalhar neste mesmo programa.
— Verdade? — digo sem acreditar.
Deus, que incrível. Derek Smeath tem uma filha. Ele provavelmente tem uma família
inteira. Uma mulher e tudo mais. Quem teria pensado nisto?
— É melhor eu ir andando — diz ele e toma o último gole da sua xícara de plástico. —
Este foi um pequeno desvio não programado. — E me dirige um olhar severo. — Eu a
vejo amanhã.
— Estarei lá — digo rapidamente enquanto se afasta em direção à saída. — E... e
obrigada. Muito obrigada.
Quando ele desaparece, afundo numa cadeira próxima. Não posso acreditar muito bem
que acabei de ter uma conversa agradável e civilizada com Derek Smeath. Com Derek
Smeath! E ele parece bom de coração. Tem sido tão bom comigo, e sua filha trabalha em
televisão... quero dizer, quem sabe, talvez eu ainda venha a conhecê-la também. Talvez
fique amiga da família inteira. Não seria fantástico? Vou começar a jantar na casa deles, e
sua esposa vai me dar um abraço caloroso quando eu chegar, e eu a ajudarei com a salada
e tudo mais...
— Rebecca! — vem uma voz por trás de mim e me viro para ver Zelda aproximar-se,
ainda com sua prancheta na mão.
— Olá — digo feliz. — Como vão as coisas?
— Ótimas — diz ela, e puxa uma cadeira. — Bem, quero ter uma conversinha com
você.
— Ah — digo. — Tudo bem. Sobre o quê?
— Nós achamos que você se saiu tremendamente bem hoje — diz Zelda, cruzando
uma perna sobre a outra nos seus jeans. Tremendamente bem. Já falei com Emma e Rory
e com nosso produtor sênior — faz uma pausa para efeito — e eles todos gostariam de
vê-la novamente no programa.
Olho para ela sem acreditar.
— Você quer dizer...
— Não toda semana — diz Zelda. — Mas quase regularmente. Pensamos em talvez
três vezes por mês. Você acha que seu trabalho permitiria isso?
— Eu... eu não sei — digo, estupefata. — Espero que sim.
— Excelente! — diz Zelda. — Provavelmente nós poderíamos promover sua revista
também, e deixá-los felizes. — Ela rabisca alguma coisa numa folha de papel e olha para
mim. — Agora, você não tem um agente, não é? Portanto precisarei falar de dinheiro
diretamente com você. — Ela pausa e olha para sua prancheta. — O que estamos
oferecendo, por quadro, é...

VINTE E TRÊS

Coloco minha chave na fechadura e, lentamente, abro a porta do apartamento. Parece que
se passaram um milhão de anos desde que estive lá da última vez e me sinto uma pessoa
completamente diferente. Cresci. Ou mudei. Ou algo assim.
— Olá — digo cautelosamente no silêncio e largo minha bolsa no chão. — Tem
alguém...
— Bex! — suspira Suze, surgindo pela porta da sala de estar. Está usando leggings
pretas justas e segura uma moldura de retrato de brim quase pronta numa das mãos. - Ah,
meu Deus! Onde você esteve? O que tem feito? Eu a vi no Morning Coffee e não pude
acreditar! Tentei telefonar para lá e falar com você, mas disseram que eu precisava ter um
problema financeiro. E eu disse, tudo bem, como devo investir meio milhão? Mas eles
disseram que não era isso — ela interrompe. — Bex, onde você esteve? O que
aconteceu?
Não respondo de imediato. Estou olhando para a pilha de cartas na mesa endereçadas a
mim. Envelopes brancos, com aparência de oficiais, envelopes marrons, envelopes
marcados com ameaças, "Ultimo Aviso". A pilha de cartas mais assustadora que já se
viu.
Exceto que, de algum modo, elas não parecem mais tão assustadoras.
— Estava na casa de meus pais — respondo, ornando para ela. — E depois estava na
televisão.
— Mas eu telefonei para seus pais! Eles disseram que não sabiam onde você estava!
— Eu sei — digo, corando levemente. — Eles estavam... me protegendo de um
perseguidor. — Quando olho para ela vejo que está sem compreender nada. O que
acredito ser mais do que justo. — Bem — acrescento, defensiva — deixei um recado na
secretária eletrônica dizendo para você não se preocupar porque eu estava bem.
— Eu sei — reclama Suze —, mas é isto que sempre fazem nos filmes. E significa que
os "do mal" te pegaram e você está com um revólver na cabeça. Honestamente, achei que
estava morta! Achei que estava, bem, em algum lugar, cortada em um milhão de pedaços.
Olho para ela novamente. Não está brincando. Estava realmente preocupada. De
repente sinto-me péssima. Nunca deveria ter desaparecido assim. Foi uma coisa
completamente impensável, irresponsável e egoísta.
— Ah, Suze. — Num impulso, corro para ela e a abraço com força. — Sinto muito
mesmo. Nunca quis fazer você sofrer.
— Está tudo bem — diz Suze, me abraçando também. — Fiquei preocupada por um
tempo, mas depois soube que você devia estar bem quando a vi na televisão. Esteve
fantástica, por falar nisto.
— Verdade? — digo, com um pequeno sorriso tremulando no canto da minha boca. —
Você gostou mesmo?
— Ah, sim! — diz Suze. — Muito melhor do que aquele cara, Luke Brandon. Deus,
ele é arrogante.
— Sim — digo após uma pequena pausa. — Sim, suponho que sim. Mas ele foi muito
bom comigo afinal.
— Verdade? — diz Suze indiferente. — Bem, de qualquer modo, você estava
brilhante. Quer um café?
— Adoraria — respondo e ela desaparece na cozinha.
Pego minhas cartas e contas e começo a folheá-las devagar. Numa outra época, esta
pilha teria me deixado num estado de pânico total. Na verdade, elas teriam ido direto para
o lixo, sem serem lidas. Mas sabe o quê? Hoje não sinto uma centelha de medo.
Honestamente, como eu pude ser tão boba quanto às minhas finanças? Como pude ser tão
covarde? Desta vez vou encará-las adequadamente. Vou sentar com meu talão de cheques
e meu último extrato bancário e organizar metodicamente essa confusão toda.
Olhando para o punhado de envelopes na minha mão, sinto-me de repente muito adulta
e responsável. Perspicaz e sensível. De agora em diante, vou organizar minha vida e
manter minhas finanças em ordem. Mudei total e absolutamente minha atitude em relação
a dinheiro.
Além disso...
Tudo bem, eu não ia contar isso a você. Mas Morning Coffee está me pagando
fortunas. Fortunas. Você não vai acreditar, mas por cada "ligue-agora" que fizer, vou
receber...
Ah, agora já estou envergonha da. Digamos que seja.., é muito. Hi-hii!
Eu simplesmente não consigo parar de rir com isso. Estou nas nuvens desde que me
disseram. Portanto, agora vou poder pagar com facilidade todas essas contas. A fatura
do VISA, meu cartão da Octagon, o dinheiro que devo a Suze — tudo! Finalmente,
finalmente minha vida vai ficar em ordem.
— E então, por que você desapareceu sem mais nem menos? — pergunta Suze,
voltando da cozinha e me fazendo pular. — Qual foi o problema?
— Não sei exatamente — digo com um suspiro, devolvendo as cartas à mesa do hall.
— Só precisei me afastar e pensar. Estava muito confusa.
— Por causa de Tarquin? — pergunta Suze de repente, e sinto-me enrijecer apreensiva.
— Um pouco — digo após uma pausa e engulo. — Por quê? Ele por acaso...
— Sei que você não é tão interessada em Tarkie — diz Suze pensativa — mas acho
que ele ainda gosta muito de você. Veio até aqui umas duas noites atrás e deixou esta
carta.
Ela aponta para um envelope creme grudado no espelho. Com as mãos levemente
trêmulas eu o pego. Ah, Deus, o que ele diz? Hesito, depois rasgo o envelope e uma
entrada de teatro cai no chão.
— A ópera! — exclama Suze, pegando-o. — Hoje! — Ela olha para mim. — Deus,
que sorte que você voltou hoje, Bex.
Minha querida Rebecca. Estou lendo sem acreditar. Desculpe minha reserva não a
procurando antes. Mas quanto mais o tempo passa, mais percebo o quanto gostei de
nossa saída e o quanto gostaria de repetir.
Envio em anexo uma entrada para a ópera Die Meistersinger, na Opera House. Vou
assistir de qualquer modo e, se você puder me acompanhar, ficarei muito feliz.
Um beijo do seu
Tarquin Cleath-Stuart
Olho para a carta, completamente confusa. O que isto significa? Que Tarquin não me
viu folheando seu talão de cheques, afinal? Que viu — mas decidiu me perdoar? Que ele
é um completo esquizóide?
— Ah, Bex, você precisa ir! — diz Suze, lendo por cima do meu ombro. — Você
precisa ir. Ele ficará arrasado se não for. Eu realmente acho que ele gosta de você.
— Não posso ir — respondo deixando a carta na mesa. — Tenho um encontro de
negócios hoje à noite.
— Então tudo bem! — diz Suze. — Poderá cancelá-lo.
— Eu... eu não posso. É muito importante.
— Ah — diz Suze desapontada. — Mas e o pobre Tarkie? Vai ficar sentado lá,
esperando você, todo ansioso...
— Vá você no meu lugar — sugiro. — Vá você.
— Verdade? — Suze faz uma careta e olha para a entrada. — Mas sinceramente... — E
me olha. — Com quem é seu encontro de negócios, afinal?
— É... é com Luke Brandon — digo, tentando parecer despreocupada. Mas não
adianta, posso sentir meu rosto corar.
— Luke Brandon? — diz Suze, pasma. — Mas o que... — Ela me olha e sua expressão
lentamente se transforma. — Ah, não, Bex! Não me diga...
— E apenas um encontro de negócios — explico, evitando seu olhar. — Só isso. Dois
profissionais se encontrando e falando sobre negócios. Numa... numa situação de
negócios. É tudo.
E entro correndo para meu quarto.
Encontro de negócios. Roupas para um encontro de negócios. Tudo tem, vamos dar
uma olhada.
Tiro todas as roupas do armário e espalho na cama. Tailleur azul, tailleur preto,
tailleur rosa. Horríveis. Tailleur de riscas? Hummm. Talvez seja exagerado. Tailleur
creme... tem cara de casamento. Tailleur verde... não significa má sorte ou algo assim?
— E então o que vai vestir? — pergunta Suze olhando pela porta aberta do quarto. —
Vai comprar alguma coisa nova? — Seu rosto se ilumina. — Ei, vamos fazer compras?
— Compras? — digo distraída. — Hã... talvez.
Normalmente, claro, jamais recusaria um convite para ir às compras. Agarraria esta
chance. Mas de algum modo noje... Ah, não sei. Me sinto ansiosa demais para fazer
compras. Muito tensa. Acho que não serei capaz de dedicar toda a minha atenção a elas.
— Bex, você me ouviu? — diz Suze surpresa. — Eu disse "Vamos fazer compras?"
— Sim, eu sei. — Olho para ela e depois pego um top preto e olho para ele
criteriosamente. — Na verdade acho eu vou deixar para outro dia.
— Você quer dizer... — Suze faz uma pausa. — Quer dizer que você não quer sair
para fazer compras?
— Exatamente.
Há um silêncio. Olho para Suze e a vejo me observando.
— Não entendo — diz ela, parecendo bastante aborrecida. — Por que você está agindo
tão estranho?
— Não estou agindo estranho! — Encolho os ombros. — Só não estou com vontade de
fazer compras.
— Ah, Deus, há algo de errado, não há? — reclama Suze gemendo. — Eu sabia.
Talvez você esteja realmente doente. — Ela entra no quarto e coloca a palma da mão na
minha testa. — Você está com febre? Alguma dor?
— Não — digo rindo. — Claro que não!
— Você bateu a cabeça em algum lugar? — Abana a mão na frente do meu rosto. —
Quantos dedos você vê aqui?
— Suze, estou bem — digo afastando sua mão. — Honestamente. Eu só... não estou
num clima de compras. — Seguro um tailleur cinza contra meu corpo. — O que acha
deste?
— Sinceramente, Bex, estou preocupada com você — diz Suze balançando a cabeça.
— Acho que deveria ser examinada. Você está tão... diferente. Estou assustada.
— Sim, bem... — Pego uma camisa branca e sorrio para ela. — Talvez eu tenha
mudado.
Levo a tarde inteira para decidir sobre uma roupa. Experimento muita coisa, misturo e
combino, e de repente me lembro de coisas no fundo do guarda-roupa (preciso usar esses
jeans lilás algum dia). Acabo me decidindo por uma roupa simples e básica. Meu melhor
tailleur preto (liquidação da Jigsaw, de dois anos atrás), uma camiseta branca (M&SO) e
botas de camurça pretas até o joelho (Dolce & Gabbana, mas eu disse a minha mãe que
eram da BHS.O que foi um erro, porque depois ela quis comprar um par para ela e tive
que mentir que tinham sido todas vendidas). Visto tudo, enrosco meu cabelo para cima
num nó e olho para minha figura no espelho.
— Muito bonita — diz Suze, admirando da porta. — Muito sexy.
— Sexy? — Sinto uma ponta de desapontamento. — Não estou querendo ficar sexy!
Quero ficar com uma aparência profissional.
— Não pode ser as duas coisas ao mesmo tempo? — sugere Suze. — Profissional e
sexy?
— Eu... não — digo após uma pausa e desvio o olhar. — Não, eu não quero.
Não quero que Luke Brandon pense que me arrumei toda bonita só para ele, é o que
realmente quero dizer. Não quero dar a ele a menor chance de pensar que entendi errado
o motivo deste encontro. Não como da última vez.
Sem nenhum aviso, uma onda de humilhação fresca passa pelo meu corpo quando me
lembro daquele momento horrível na Harvey Nickols. Balanço minha cabeça com força,
procurando afastar aquilo da mente, procurando acalmar as batidas do meu coração. Por
que diabos concordei com essa droga de jantar afinal?
— Eu só quero parecer o mais séria e profissional possível — digo e franzo a testa
séria diante desta minha reflexão.
— Eu sei. Então — diz Suze — você precisa de uns acessórios. Alguns acessórios do
tipo mulher de negócios.
— Como o quê? Uma agenda?
— Como... — Suze faz uma pausa pensativa. — Está bem, tive uma idéia. Espere aí.
Chego ao Ritz, naquela noite, cinco minutos depois das 7:30, o horário marcado. Na
entrada do restaurante, vejo que Luke já chegou. Está sentado, recostado, com um ar
relaxado e bebe alguma coisa que se assemelha a um gim-tônica. Está usando um terno
diferente daquele desta manhã, não posso deixar de perceber, com uma camisa leve,
verde-escura. Ele na verdade está... Bem. Muito bem. Bastante bonito.
Na verdade não está com uma aparência muito profissional.
E, pensando Lem, este restaurante também não parece muito de negócios. E cheio de
candelabros, guirlandas douradas e cadeiras de um rosa suave, com o teto lindamente
pintado de nuvens e flores. O lugar todo brilha com a luz e é...
Bem, na verdade, a palavra que me vem à cabeça é romântico.
Ah, Deus. Meu coração começa a bater acelerado de nervoso e olho rapidamente para
minha imagem num espelho dourado. Estou usando o tailleur preto da Jigsaw, a camiseta
branca e as botas de camurça preta como originalmente planejado. Mas, agora, também
tenho um exemplar dobrado do Financial Times debaixo do braço, um par de óculos de
tartaruga (com vidros claros) presos na cabeça, minha velha pasta executiva numa das
mãos e — a pièce de résistance de Suze — um laptop AppleMac na outra.
Talvez tenha exagerado.
Estou quase voltando para ver se posso rapidamente guardar a pasta no armário de
casacos (ou, para ser sincera, só deixar numa cadeira e me afastar), quando Luke se vira
para meu lado, me vê e sorri. Droga. Sou forçada a ir em frente pelo carpete felpudo,
procurando parecer o mais calma possível, apesar de ter um braço grudado no corpo para
evitar que o FT caia no chão.
— Olá — diz Luke quando chego na mesa. Levanta para me cumprimentar e eu
percebo que não posso apertar sua mão por causa do laptop. Sem graça, largo a pasta no
chão, transfiro o laptop para o outro lado — quase deixando cair o FT nessa hora — e,
com o rosto levemente avermelhado, estendo minha mão.
Um ar de riso passa pelo rosto de Luke e ele, solene, aperta minha mão. Aponta uma
cadeira e observa educadamente enquanto coloco o laptop sobre a toalha da mesa, pronto
para uso.
— É uma máquina impressionante — diz ele. — Muito... high-tech.
— Sim — replico e dou um sorriso breve e calmo. — Eu uso o laptop com freqüência
para fazer anotações em reuniões de trabalho.
— Ah — diz Luke acenando com a cabeça. — Muito organizado de sua parte.
Obviamente ele está esperando que eu o ligue portanto, experimentalmente, aperto a
tecla return para ligar. Isto, segundo Suze, deve fazer a tela aparecer. Mas nada acontece.
Casualmente, aperto a tecla novamente — e ainda nada. Cutuco, fingindo que meu
dedo escorregou por acidente — e, ainda nada. Merda, que situação embaraçosa. Por que
tenho sempre que acreditar na Suze?
— Algum problema? — pergunta Luke.
— Não! — respondo imediatamente e fecho a tampa. — Não, eu só... Pensando bem,
não vou usá-lo hoje. — Procuro na bolsa um caderno de notas. — Vou anotar as coisas
aqui.
— Boa idéia — diz Luke suavemente. — Gostaria de um champanhe?
— Ah — digo um pouco amedrontada. — Bem... está bem.
— Excelente — diz Luke. — Esperava que quisesse.
Ele olha para um lado e um garçom sorridente corre na nossa direção com uma garrafa.
Nossa, champanhe Krug.
Mas não vou sorrir ou parecer contente ou algo assim. Vou ficar bastante fria e
profissional. Na verdade, só vou tomar uma taça, antes de mudar para água pura. Afinal,
preciso manter a cabeça lúcida.
Enquanto o garçom enche minha taça de champanhe, escrevo no caderno: "Reunião
entre Rebecca Bloom e Luke Brandon." Olho para o que escrevi, analiso e depois
sublinho duas vezes. Pronto. Parece muito eficiente.
— Então — digo fitando-o, e levanto os óculos. — Ao trabalho.
— Ao trabalho — repete Luke e dá um sorriso irônico. — O pouco que ainda me resta.
— Verdade? — Olho para ele confusa e aí eu percebo. — Quero dizer, depois do que
você disse no Morning Coffee? Aquilo o deixou em apuros?
Ele acena que sim e sinto uma pontada de aflição por ele.
Quero dizer, Suze está certa — Luke é bastante arrogante. Mas devo dizer que achei
muito bom da parte dele levantar a cabeça daquele jeito e dizer publicamente o que
realmente pensava da Flagstaff Life. E, agora, se ele vai ficar arruinado em decorrência
disso, bem, parece muito injusto.
— Você perdeu tudo? — pergunto calma e Luke ri.
— Eu não iria tão longe. Mas, esta tarde, tivemos que dar muitas explicações para
nossos outros clientes. — Ele faz uma careta. — Devo dizer que insultar um de seus
maiores clientes ao vivo na televisão não é exatamente uma prática normal de RP.
— Bem, acho que eles deveriam respeitar você! — retruco. — Por ter dito realmente o
que pensa! Quero dizer, tão poucas pessoas fazem isso hoje em dia. Podia ser como... o
slogan da sua empresa: "Nós dizemos a verdade.''
Tomo um gole grande de champanhe e olho para ele em silêncio. Luke está me fitando
com uma expressão estranha no rosto.
— Rebecca, você tem uma habilidade fantástica para acertar em cheio — diz ele
finalmente. — Foi exatamente o que alguns de nossos clientes disseram. É como se
tivéssemos nos dado um selo de integridade.
— Oh — digo satisfeita. — Então não está arruinado.
— Não estou arruinado — concorda Luke e abre um pequeno sorriso. — Apenas
levemente enfraquecido.
Um garçom aparece do nada, enche minha taça e eu tomo um gole. Quando olho para
Luke ele está me fitando novamente.
— Sabe, Rebecca, você é uma pessoa extremamente perspicaz — diz ele. — Enxerga o
que os outros não vêem.
— Ah, bem. — Balanço minha taça de champanhe no ar. — Não ouviu Zelda? Sou a
guru de finanças que encontra a vizinha. — Nossos olhos se encontram e os dois
começam a rir.
— Você é instrutiva e acessível.
— Informada com os pés no chão.
— Você é inteligente, charmosa, viva... — Luke murcha, olhando para sua bebida,
depois me encara.
— Rebecca, quero me desculpar — diz ele. — Estou querendo fazer isto há algum
tempo. Aquele almoço no Harvey Nickols... você estava certa. Não a tratei com o
respeito que merecia. O respeito que merece.
Termina a frase, faz-se um silêncio e eu abaixo o olhar para a toalha da mesa sentindo
meu rosto em chamas. Está tudo muito bem para ele, dizer isto agora, penso furiosa. Está
tudo muito bem para ele reservar uma mesa no Ritz e pedir champanhe e esperar que eu
sorria e diga "Ah está bem". Mas por trás de toda a brincadeira ainda me sinto ferida com
aquele episódio. E, depois de meu sucesso esta manhã, estou num humor belicoso.
— Meu artigo no Daily World não teve nada a ver com aquele almoço — digo sem
encará-lo. — Nada. E você ter insinuado que tinha...
— Eu sei — diz Luke e suspira. — Nunca deveria ter dito aquilo. Foi um comentário...
defensivo e irritado num dia em que, francamente, você tinha nos deixado a todos em
maus lençóis.
— Verdade? — Não consigo evitar um sorriso de prazer nos lábios. — Eu deixei todos
em apuros?
— Está brincando? — diz Luke. — Uma página inteira no Daily World sobre um de
nossos clientes, completamente sem mais nem menos?
Ah. Até que eu gosto desta idéia. A Brandon C. inteira em polvorosa por causa de
Janice e Martin Webster.
— Alicia também ficou baratinada? — Não consigo resistir à pergunta.
— Claro — diz Luke secamente. — Mais ainda quando eu descobri que ela havia
realmente falado com você no dia anterior.
Ah!
— Bom — ouço-me dizer infantilmente, e depois me arrepender. As grandes mulheres
de negócios não exultam de satisfação maligna quando seus inimigos são repreendidos.
Eu devia ter apenas feito um gesto significativo com a cabeça ou ter exclamado "Ah".
— Então, eu deixei você baratinado também? — pergunto, fazendo um ar de
indiferença.
O silêncio toma conta do ambiente e, depois de algum tempo, olho para ele. Luke está
com os olhos em mim, com uma expressão séria que faz meu coração começar a bater
forte.
— Você tem me deixado assim já há algum tempo, Rebecca — diz ele calmo. Mantém
o olhar por uns segundos enquanto eu também estou olhando fixo para ele, incapaz de
respirar — depois desvia para o menu.
— Vamos pedir?
Parece que demoramos a noite toda comendo. Conversamos, comemos, conversamos
mais e comemos mais um pouco. A comida é tão maravilhosa que não consigo dizer não
para nada, e o vinho está tão delicioso que abandono meu plano de beber uma única taça,
no estilo profissional, e depois me fixar na água. No momento em que estou brincando
despreocupada com um chocolate feuillantine com sorvete de mel e pêras carameladas, já
é quase meia-noite e minha cabeça está ficando pesada.
— Que tal essa coisa de chocolate? — pergunta Luke terminando de comer uma
colherada de cheesecake.
— Bom — respondo e empurro o sorvete na direção dele. — Mas não tão bom quanto
a musse de limão.
Esta é a outra coisa. Estou absolutamente empanturrada até a alma. Não consegui
decidir entre todas as sobremesas que têm um barulhinho gostoso, então Luke sugeriu
que pedíssemos todas cujos sons nós gostamos. Que foram a maioria. Portanto, agora
meu estômago esta do tamanho de um pudim de Natal, e tão pesado quanto.
Honestamente, sinto-me como se não tivesse mais condições de levantar desta cadeira.
É tão confortável e estou tão aquecida e aconchegada, e é tudo tão bonito, e minha cabeça
está girando o suficiente para me fazer não querer levantar. Além disso... eu não quero
que isto acabe. Não quero que a noite termine. Me diverti tanto. O curioso é que Luke me
faz rir muito. Você pensaria que ele é todo sério, maçante e intelectual, mas realmente ele
não é. Na verdade, imagine, não falamos sobre aquela coisa de cota de fundo fiduciário
nem uma vez.
Um garçom se aproxima, retira todos os pratos de pudim e traz uma xícara de café para
cada um. Recosto na minha cadeira, fecho meus olhos e tomo uns goles deliciosos. Ah,
Deus, eu poderia ficar aqui para sempre. Na verdade estou me sentindo realmente
sonolenta agora — um pouco porque estava tão nervosa na noite passada com o Morning
Coffee, que quase nem dormi.
— Está na hora de eu ir — digo por fim e me forço a abrir os olhos. — Preciso voltar
para... — Onde moro mesmo? — Fulham. Para Fulham.
— Certo — diz Luke, depois de uma pausa, e toma um gole de café. Coloca sua xícara
na mesa e pega o leite. Quando faz isso, sua mão passa encostando pela minha — e fica
parada. Logo sinto meu corpo todo enrijecer. Meu rosto começa a queimar e meu coração
começa a bater apreensivo.
Tudo bem, vou admitir, eu mais ou menos pus minha mão no caminho.
Só para ver o que aconteceria. Quero dizer, ele poderia facilmente mover sua mão para
trás se quisesse, não poderia? Despejar o leite, fazer uma piada, dizer boa noite.
Mas ele não faz isso. Muito lentamente, fecha sua mão sobre a minha.
E agora eu realmente não posso mexer. Seu polegar começa a traçar desenhos no meu
pulso, e eu posso sentir o quanto sua pele está quente e seca. Olho na sua direção e
encontro seu olhar, e sinto uma sacudidela dentro de mim. Não posso afastar meus olhos
dos dele. Não posso mover minha mão. Estou completamente fascinada.
— Aquele cara que vi com você no Terrazza — diz ele depois de um tempo, seu
polegar ainda desenhando figuras na minha pele relaxado. — Ele era algum...
— Só... você sabe. — Procuro dar um riso descuidado mas estou me sentindo tão
nervosa que sai como um chiado. — Um multimilionário qualquer.
Luke me olha atentamente por um segundo — e desvia o olhar.
— Certo — diz ele, como que fechando o assunto. — Bem. Talvez devêssemos
chamar um táxi para você. — Sinto um baque de decepção e procuro não demonstrar.
— Ou talvez... — Ele pára.
Há uma pausa interminável. Quase não consigo respirar. Talvez o quê? O quê?
— Conheço bem o pessoal aqui — diz Luke finalmente. — Se quiséssemos... — Ele
encontra meu olhar. — Acho que poderíamos ficar.
Sinto um choque elétrico passar pelo meu corpo.
— Você gostaria?
Incapaz de falar, aceno afirmativamente. Ah, Deus. Ah, Deus, é a coisa mais excitante
que já fiz.
— Está bem, espere aqui — diz Luke. — Vou ver se consigo quartos. — Ele se levanta
e eu olho para ele abismada, minha mão fria e abandonada.
Quartos. Quartos no plural. Então ele não quis dizer...
Ele não quer...
Ah, Deus. O que há de errado comigo?
Subimos no elevador em silêncio com um porteiro elegante. Olho umas duas vezes para
Luke, mas ele está olhando para a frente, impassível. Na verdade, ele quase não disse
uma palavra desde que saiu para perguntar sobre quartos. Sinto-me um pouco fria por
dentro — para ser sincera, estou quase querendo que eles não tivessem quarto sobrando
para nós afinal. Mas acaba que houve um grande cancelamento esta noite — e, também,
Luke é um tipo de cliente big-shot do Ritz. Quando comentei sobre como estavam sendo
gentis conosco, ele deu de ombros e disse que faz muitas reuniões de negócios aqui.
Reuniões de negócios. Então é isto que sou? Ah, não faz nenhum sentido. Eu preferia
ter ido para casa afinal.
Caminhamos por um corredor opulento, em completo silêncio, depois o porteiro abre
uma porta e nos faz entrar numa sala espetacularmente linda, decorada com uma cama de
casal e cadeiras fofas. Ele coloca minha pasta e meu AppleMac no suporte de malas,
depois Luke dá-lhe uma nota e ele desaparece.
Há uma pausa, nunca me senti mais estranha na minha vida.
— Bem — diz Luke. — É isso.
— Sim — digo numa voz que não parece minha. — Obrigada... obrigada. E pelo
jantar. — Limpo minha garganta. — Estava delicioso.
Parece que nos transformamos em completos estranhos.
— Bem —- diz Luke novamente e olha para seu relógio.
— É tarde. Você provavelmente vai querer... — Pára e faz-se um silêncio de
expectativa.
Meu coração está batendo forte no meu peito, minhas mãos estão torcidas num nó
nervoso. Não ouso olhar para ele.
— Já vou então — diz Luke finalmente. — Espero que você tenha uma...
— Não vá — ouço-me dizer e fico queimando de
vermelha. — Não vá ainda. Nós podíamos só... — Engulo. — Conversar, ou alguma
coisa.
Olho para ele, encontro seu olhar e algo amedrontador começa a bater dentro de mim.
Lentamente ele anda na minha direção, até ficar bem na minha frente. Consigo sentir
o cheiro do perfume de sua loção pós-barba e ouvir o ruído de sua camisa de algodão
quando ele se movimenta. Meu corpo inteiro está pinicando de ansiedade. Ah, Deus,
quero tocá-lo. Mas não ouso. Não ouso mexer nada.
— Nós podíamos só conversar, ou alguma coisa — ele repete e lentamente levanta as
mãos até envolverem meu rosto. — Nós podíamos só conversar. Ou alguma coisa.
E depois ele me beija.
Sua boca está na minha, gentilmente separando meus lábios, e sinto uma flechada
incandescente de excitação. Suas mãos estão descendo pelas minhas costas e envolvendo
minhas nádegas, passando os dedos sob a bainha da minha saia. Depois ele me puxa
apertado para ele e, de repente, acho difícil respirar.
E está bem óbvio que não vamos conversar muito coisa nenhuma.

VINTE E QUATRO

Humm.
Êxtase.
Deitada na cama mais confortável do mundo, estou toda sonhadora, risonha e feliz,
deixando o sol da manhã brincar nas minhas pálpebras cerradas. Esticando meus braços
acima da cabeça, depois caindo relaxada num monte enorme de travesseiros. Ah, me
sinto bem. Me sinto... satisfeita. A noite passada foi absolutamente...
Bem, digamos que foi...
Ah, convenhamos. Você não precisa saber disso. De qualquer modo, não pode usar sua
imaginação? Claro que pode.
Abro meus olhos, sento e pego minha xícara trazida pelo serviço de quarto. Luke está
no chuveiro, portanto estou sozinha com meus pensamentos. E não quero parecer
pretensiosa aqui mas realmente sinto que este é um dia bastante significativo na minha
vida.
Não é só Luke — apesar de que tudo foi... bem, maravilhoso, realmente. Deus, ele sabe
mesmo como...
De qualquer modo. Não é isto. E que não é só Luke — e não é só meu novo emprego
com o Morning Coffee (apesar de que, toda vez que me lembro, sinto um misto de alegria
e apreensão).
Não, é mais do que isso. É que me sinto como uma pessoa completamente nova. Me
sinto como se tivesse... crescido. Amadurecido. Estou vivendo um novo estágio da minha
vida — com perspectivas diferentes e prioridades diferentes. Quando olho para trás, para
a maneira frívola como costumava pensar — bem, me dá vontade de rir, juro. A nova
Rebecca é tão mais séria e equilibrada. Tão mais responsável. E como se os óculos
escuros tivessem caído e de repente eu pudesse ver o que realmente é importante no
mundo e o que não é.
Estive pensando, esta manhã, que eu poderia entrar para a política ou algo assim. Luke
e eu conversamos um pouco sobre política na noite passada, e devo dizer, apareci com
muitos pontos de vista interessantes. Eu poderia ser uma política jovem, moderna,
intelectual e ser entrevistada sobre várias questões importantes na televisão. Eu
provavelmente me especializaria em saúde ou educação, algo assim. Talvez em relações
exteriores.
Casualmente pego o controle remoto e ligo a televisão, pensando que poderia assistir
ao noticiário. Clico algumas vezes procurando a BBC1, mas a televisão parece ligada
somente em canais a cabo. Finalmente desisto, deixo sintonizada num canal chamado
QVT, ou coisa parecida, e recosto nos meus travesseiros.
A verdade, eu penso, tomando um gole de café, é que sou uma pessoa bastante séria.
Provavelmente, é por isso que Luke e eu nos damos tão bem.
Hummm, Luke. Hummm, é um pensamento bom. Onde será que ele está?
Sento na cama e quando estou justamente pensando em entrar no banheiro para
surpreendê-lo, a voz de uma mulher na televisão atrai minha atenção.
"... oferecendo óculos escuros NK Malone legítimos. Em tartaruga preta e branca, com
a logomarca inconfundível NKM em cromo escovado."
É interessante, penso preguiçosa. Óculos escuros NK Malone. Sempre quis ter um par.
"Comprando os três pares... — a mulher pausa — ...não gastará 400 libras. Nem 300.
Mas, 200 libras! Uma economia de pelo menos quarenta por cento no preço recomendado
para venda."
Olho para a tela fascinada.
Mas isto é inacreditável. Inacreditável. Sabe quanto os óculos NK Malone custam
geralmente? Pelo menos 140 libras. Cada um! O que significa estar economizando...
"Não mande dinheiro agora — a mulher está dizendo. "Simplesmente ligue para este
número..."
Meu coração está batendo rápido, procuro meu caderno de anotações na mesa-decabeceira
e escrevo correndo o número. E um sonho transformado em realidade. Óculos
escuros NK Malone. Mal consigo acreditar. E três pares! Nunca mais vou precisar
comprar óculos escuros. As pessoas vão me chamar de "A Garota dos Óculos Escuros
NK Malone". (E aqueles Armani, que comprei no ano passado, já estão ultrapassados
agora. Totalmente fora de moda.) Ah, trata-se de um ótimo investimento.
Com as mãos tremendo, disco o número e a ligação é imediata! Eu imaginava que todo
mundo estaria tentando ligar para lá, de tão bom negócio. Dou meu nome e endereço,
agradeço muito à mulher, depois desligo com um sorriso de felicidade grudado no rosto.
Este dia está perfeito. Absolutamente perfeito. E ainda são nove noras!
Feliz, volto a me aconchegar debaixo das cobertas e fecho os olhos. Talvez Luke e eu
passemos o dia todo aqui, neste quarto lindo. Talvez pecamos para nos mandarem ostras
e champanhe para o quarto. (Na verdade, espero que não, pois odeio ostras.) Talvez nós...
Nove horas, interrompe uma vozinha na minha mente. Franzo a testa por um segundo,
balanço a cabeça, depois mudo de lado para livrar-me. Mas ela ainda está ah, me
cutucando, me aborrecendo, atrapalhando meus pensamentos.
Nove horas. Nove...
E, como um raio, sento-me bem reta na cama, o coração batendo de pavor. Ah, meu
Deus.
Nove e meia.
Derek Smeath.
Prometi que estaria lá. Eu prometi. E aqui estou, aqui bem longe no Ritz, faltando
apenas meia hora. Ah, Deus. O que vou fazer?
Desligo a televisão, enterro a cabeça nas mãos e procuro pensar calma e racionalmente.
Tudo bem, se eu fosse agora mesmo, poderia chegar a tempo. Se eu me vestisse o mais
rápido possível, corresse lá para baixo e pulasse dentro de um táxi — poderia chegar a
tempo. Fulham não é tão longe assim. E eu poderia chegar quinze minutos atrasada, não
poderia? Nós ainda teríamos condição de ter a reunião. Ela ainda poderia acontecer.
Em teoria, ela ainda poderia acontecer.
— Oi — diz Luke, esticando a cabeça à porta do banheiro. Ele está com uma toalha
branca enrolada no corpo, e umas gotas de água brilham nos seus ombros. Nem percebi
seus ombros na noite passada, penso eu, olhando para eles. Deus, eles são danados de
sexy. Na verdade, no todo, ele é pra lá de...
— Rebecca? Está tudo bem?
— Ah — digo, começando levemente. — Sim, tudo está ótimo. Maravilhoso! Ah, e
sabe o quê? Acabei de comprar os mais maravilhosos...
Por alguma razão, paro no meio da frase.
Não sei bem por quê.
— Só... tomando café — resolvo dizer e aponto para a bandeja do serviço de quarto. —
Delicioso.
Um olhar levemente confuso passa pelo rosto de Luke e ele desaparece de volta para o
banheiro. Tudo bem, rápido, digo a mim mesma. O que vou fazer? Me vestir e ir embora?
Chegar a tempo da reunião?
Mas minha mão já está pegando a bolsa como se tivesse vontade própria; estou
pegando um cartão e digitando um número no aparelho telefônico.
Porque, quero dizer, na verdade nós não precisamos ter uma reunião, precisamos?
E eu provavelmente nunca chegaria a tempo mesmo.
E ele provavelmente nem se importaria. Deve ter milhares de outras coisas que
preferiria estar fazendo em vez disso. De fato, ele nem vai perceber.
- Alô? - digo ao telefone e sinto um zunido de prazer quando Luke se aproxima por
trás de mim e começa a acariciar minha orelha. — Alô, sim. Eu gostaria... eu gostaria de
deixar um recado para o Sr. Smeath.

BANK OF HELSINKI
HELSINKI HOUSE
124 LOMBARD ST
LONDRES EC2D 9YF
Rebecca Bloom
a/c William Green Recrutamento
39 Farringdon Square
Londres EC4 7TD
5 de abril de 2000
Hyvä Rebecca Bloom
Saanen jälleen kerran onnitella teitä hienosta suorituksestanne — tällä kertaa "Morning
Coffee" — Ahjelmassa. Arvostelukykynne ja näkemyksenne tekivät minuun syvän
vaikutuksen ja uskon, että teistä olisi suurta hyötyä täällä Helsingin Pankissa.
Olette todennäköisesti saanut lukemattomia työtarjouksia — teidän lahjoillanne voisi
hyvin saada minkä takansa toimen "Financial Timesista." Pyydän teitä kuitenkin vielä
keran karkitsemaan vaatimatonta yjtiótämme.
Parhaiten teille ehkä sopisi viestintävirkailijan paikka, joka meillä on tällä hetkellä
avoinna. Toimen edellinen haltija erotettiin kiljattain hänen luettuaan töissä
"Playboyta."
Parhain terveisin
Ystävällisesti
Jan Virtanen

MOLDURAS FINAS LTDA.
A família feliz que trabalha em casa


Burnside Road 230ª
Leeds L6 4ST
Srta. Rebecca Bloom
Apto. 2
4 Burney Road
Londres SW6 8FD
7 de abril de 2000
Prezada Rebecca
Escrevo-lhe para confirmar o recebimento de 136 Molduras Finas terminadas (estilo
'Sherborne' — azul). Muito obrigado por seu excelente trabalho. Um cheque de 272 libras
segue anexo, juntamente com um formulário de inscrição para nosso próximo pacote de
confecção de molduras.
Nossa gerente de controle de qualidade, a Sra. Sandra Rowbotham, pediu-me para
informar-lhe que ficou extremamente impressionada com a qualidade de seu primeiro
lote. Novatos raramente chegam aos padrões de exatidão da Promessa de Qualidade
Molduras Finas — está evidente que você tem um dom natural para a confecção de
molduras.
Portanto, gostaria de convidá-la para demonstrar sua técnica em nossa próxima
Convenção de Confeccionadores de Molduras, a realizar-se em Wilmslow, no dia 21 de
junho. É uma ocasião em que todos os membros da família que trabalha em casa, de
Molduras Finas, se reúnem sob o mesmo teto, com a oportunidade de trocarem dicas
sobre a confecção de molduras e anedotas. É muito divertido, acredite!
Aguardamos ansiosos sua resposta.
Feliz confecção de molduras!
Malcolm Headley
Diretor-Administrativo
P.S: Você é a mesma Rebecca Bloom que dá conselhos no Morning Coffee?

Endwich Bank
AGÊNCIA FULHAM
3 Fulham Road
Londres SW6 9JH
Srta. Rebbeca Bloom
Apto. 2
4 Burney Road
Londres SW6 8FD
10 de abril de 2000
Prezada Srta. Bloom
Obrigado por sua mensagem na secretária eletrônica no domingo, 9 de abril.
Sinto muito ouvir que ainda está sofrendo de agorafobia aguda.
Considerando o estado relativamente saudável de sua conta corrente no presente
momento, sugiro que adiemos nossa reunião por enquanto.
Contudo, esteja certa de que estarei bem atento e entrarei em contato, caso a situação se
modifique de alguma forma.
Com os melhores votos,
Atenciosamente
Derek Smeath
Gerente
P.S.: Gostei muito de seu desempenho no Morning Coffee de ontem.

ENDWICH – PORQUE NOS IMPORTAMOS

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