segunda-feira, 14 de março de 2011

Harry Potter e a Pedra Filosofal - Capítulos 13 e 14

CAPÍTULO TREZE
Nicolau Flamel

Dumbledore convencera Harry a não tornar a procurar o Espelho de
Ojesed, e durante o resto das férias de Natal a capa da invisibilidade permaneceu
guardada no fundo do baú. Harry gostaria de poder esquecer o que vira no
espelho com a mesma facilidade, mas não conseguiu. Começou a ter pesadelos.
Sonhava repetidamente com os pais desaparecendo em um relâmpago de luz
verde enquanto uma voz esganiçada gargalhava.
— Está vendo? Dumbledore tinha razão, aquele espelho podia deixar você
maluco — disse Rony, quando Harry lhe contou os sonhos.
Hermione, que voltou um dia antes do período letivo começar, viu as
coisas de outro modo. Estava dilacerada entre o horror de pensar em Harry fora
da cama, perambulando pela escola três noites seguidas ("E se Filch tivesse te
apanhado!") e o desapontamento que ele não tivesse ao menos descoberto
quem era Nicolau Flamel.
Quase perdera as esperanças de encontrar Flamel em um livro da
biblioteca, embora Harry tivesse certeza de que lera o nome em algum lugar.
Quando o novo período letivo começou, eles voltaram a folhear os livros durante
os dez minutos de intervalo entre as aulas. Harry tinha ainda menos tempo do que
os outros dois, porque o treino de Quadribol recomeçara.
Olívio estava puxando pelo time como nunca fizera antes. Até mesmo as
chuvas intermináveis que substituíram as nevadas não conseguiam esmorecer a
sua animação. Os Weasley reclamavam que Olívio estava se tornando fanático,
mas Harry o apoiava. Se ganhassem a próxima partida, contra Lufa-Lufa,
passariam a frente da Sonserina no campeonato das casas pela primeira vez em
sete anos. Além do desejo de ganhar, Harry descobriu que tinha menos pesadelos
quando voltava exausto dos treinos.
Então, durante um treino particularmente chuvoso e enlameado, Olívio
deu uma notícia ruim ao time. Acabara de se enfurecer com os Weasley, que
davam mergulhos violentos um sobre o outro e fingiam cair das vassouras.
— Vocês querem parar de se comportar feito bobos! — berrou. — Isso é o
tipo de atitude que vai fazer a gente perder o jogo! Snape vai apitar dessa vez e
vai procurar qualquer desculpa para tirar pontos da Grifinória!
Jorge Weasley realmente caiu da vassoura ao ouvir isso.
— Snape vai apitar o jogo? — perguntou embolando as palavras com a
boca cheia de lama. — Quando foi na vida que ele apitou um jogo de Quadribol?
Ele não vai ser imparcial se tivermos chance de passar à frente de Sonserina.
O resto do time pousou ao lado de Jorge para reclamar também.
— A culpa não é minha — disse Olívio. — Nós é que vamos ter de nos
cuidar e jogar uma partida limpa, para não dar a Snape desculpa para implicar
conosco.
Estava tudo muito bem, pensou Harry, mas ele tinha outra razão para não
querer Snape por perto quando estivesse jogando Quadribol.
Os outros jogadores se demoraram conversando no final do treino como
sempre faziam, mas Harry rumou direto para a sala comunal de Grifinória, onde
encontrou Rony e Hermione jogando xadrez. Xadrez era a única coisa em que
Hermione perdia, uma experiência que Rony e Harry achavam que lhe fazia muito
bem.
— Não fale comigo agora — pediu Rony quando Harry se sentou ao seu
lado. — Preciso me concentrar. – Ai, viu a cara do Harry.
— Que aconteceu com você? Está com uma cara horrível.
Falando baixinho para ninguém mais ouvir, Harry contou aos dois o desejo
sinistro e súbito de Snape de ser juiz de Quadribol.
— Não jogue — disse Hermione na mesma hora.
— Diga que está doente — aconselhou Rony.
— Finja que quebrou a perna — sugeriu Hermione.
— Quebre a perna de verdade — insistiu Rony.
— Não posso — respondeu Harry — Não temos apanhador de reserva.
Se eu fujo, Grifinória não vai poder jogar.
Naquele momento, Neville entrou aos tombos na sala comunal.
Como conseguira passar pelo buraco do retrato ninguém sabia, porque
tinha as pernas grudadas pelo que eles imediatamente reconheceram ser o Feitiço
da Perna Presa. Devia ter precisado andar aos pulos como um coelho até a torre
de Grifinória.
Todo o mundo caiu na gargalhada menos Hermione, que ficou em pé de
um salto e fez o contra-feitiço. As pernas de Neville se separaram e ele se
endireitou, tremendo.
— Que aconteceu? — perguntou Hermione, levando-o para se sentar com
Harry e Rony.
— Malfoy — disse Neville com a voz trêmula. — Encontrei-o na saída da
biblioteca. Ele disse que estava procurando alguém em quem praticar o feitiço.
— Vá procurar a Professora Minerva! — insistiu Hermione. — Dê
parte dele!
Neville sacudiu a cabeça.
— Não quero mais confusão — murmurou.
— Você tem de enfrentá-lo, Neville! — disse Rony. — Ele
está acostumado a pisar nas pessoas, mas não há razão pata você se deitar aos
pés dele para facilitar.
— Não precisa me dizer que não sou bastante corajoso para pertencer a
Grifinória. Draco já fez isso — disse Neville engasgado.
Harry apalpou o bolso de suas vestes e tirou um sapo de chocolate, o
último da caixa que Hermione lhe dera no Natal. Deu-o a Neville, que estava com
cara de quem ia chorar.
— Você vale doze Dracos — disse Harry. — O Chapéu Seletor escolheu
você para Grifinória, não foi? E onde está Draco? Naquela Sonserina nojenta.
A boca de Neville se contraiu num sorrisinho enquanto desembrulhava o
sapo.
— Obrigado, Harry. Acho que vou para a cama... Você quer o cartão, você
coleciona, não é?
Quando Neville se afastou, Harry olhou para o cartão de Bruxo Famoso.
— Dumbledore outra vez. Ele foi o primeiro que...
E soltou uma exclamação. Olhou para o verso do cartão. Em seguida
olhou para Rony e Hermione.
— Encontrei!— murmurou — Encontrei Flamel! Eu disse a vocês que tinha
lido o nome dele em algum lugar. Li-o no trem a caminho daqui. Escutem só isso:
O Professor Dumbledore é particularmente famoso por ter
derrotado Grindelwald, o bruxo das Trevas, em 1945, e ter
descoberto os doze usos do sangue de dragão, e por desenvolver um
trabalho de alquimia em parceria com Nicolau Flamel.
Hermione ficou em pé de um salto. Não parecia tão animada desde que
eles tinham recebido as notas do primeiro dever de casa.
— Não saiam daqui! — disse e saiu escada acima em direção
aos dormitórios das meninas. Harry e Rony mal tiveram tempo de trocar um olhar
intrigado e ela já estava correndo de volta, com um enorme livro velho nos braços.
— Nunca pensei em olhar aqui — falou excitada. — Tirei-o da biblioteca
há semanas para me distrair um pouco.
— Distrair? — admirou-se Rony, mas Hermione mandou-o ficar quieto,
enquanto procurava alguma coisa e começou a folhear as páginas do livro,
ansiosa, resmungando para si mesma.
Finalmente encontrou o que procurava.
— Eu sabia! Eu sabia!
— Já podemos falar? — perguntou Rony de mau humor.
Hermione não lhe deu resposta.
— Nicolau Flamel — sussurrou ela teatralmente — é, ao que se sabe, a
única pessoa que produziu a Pedra Filosofal.
A frase não teve bem o efeito que ela esperava.
— A o quê? — exclamaram Harry e Rony.
— Ah, francamente, vocês dois não lêem? Olhem, leiam isso aqui.
Ela empurrou o livro para os dois, que leram:
O antigo estudo da alquimia preocupava-se com a produção
da Pedra Filosofal, uma substancia lendária com poderes fantásticos.
A pedra pode transformar qualquer metal em ouro puro. Produz
também o Elixir da Vida, que torna quem o bebe imortal.
Falou-se muito da Pedra Filosofal durante séculos, mas
a única Pedra que existe presentemente pertence ao Sr. Nicolau
Flamel o famoso alquimista e amante da opera. O Sr. Flamel
que comemorou o seu sexcentésimo sexagésimo quinto aniversário
no ano passado, leva uma vida tranqüila em Devon, com sua
mulher, Perenelle (seiscentos e cinqüenta e oito anos).
— Viram? — disse Hermione, quando Harry e Rony terminaram. — O
cachorro deve estar guardando a Pedra Filosofal de Flamel! Aposto que ele pediu
a Dumbledore que a guardasse em segurança, porque são amigos e ele sabia que
alguém andava atrás dela, esse é o motivo por que Dumbledore quis transferir a
pedra de Gringotes.
— Uma pedra que produz ouro e não deixa a gente morrer! — exclamou
Harry. — Não admira que Snape ande atrás dela! Qualquer um andaria.
— E não admira que não conseguíssemos encontrar Flamel em Estudos
aos avanços recentes em magia — disse Rony — Ele não é bem recente, se já fez
seiscentos e sessenta e cinco anos, não é mesmo?
Na manhã seguinte, na sala de Defesa Contra a Magia Negra, enquanto
copiavam as diferentes maneiras de tratar mordidas de lobisomem, Harry e Rony
continuavam a discutir o que fariam com uma Pedra Filosofal se tivessem uma.
Somente quando Rony disse que compraria o próprio time de Quadribol foi que
Harry se lembrou de Snape e da partida que se aproximava.
— Eu vou jogar — disse a Rony e Hermione. — Se não fizer isso,
o pessoal de Sonserina vai pensar que tenho medo de encarar Snape. Vou
mostrar a eles... Vamos tirar aquele sorriso da cara deles se vencermos.
— Desde que a gente não acabe tirando você da quadra —
disse Hermione.
À medida que a partida se aproximava, porém, Harry foi ficando cada vez
mais nervoso, mesmo que negasse isso para Rony e Hermione. O resto do time
também não estava tão calmo assim. A idéia de passar à frente de Sonserina no
campeonato das casas era maravilhosa, ninguém fazia isso havia quase sete
anos, mas será que conseguiriam, com um juiz tão parcial?
Harry não sabia se estava ou não imaginando, mas parecia estar sempre
encontrando Snape por todo lugar em que ia. Às vezes, ele até se perguntava se
Snape não o estava seguindo, tentando apanhá-lo sozinho. As aulas de Poções
estavam se transformando numa espécie de tortura semanal. De tão ruim
que Snape era com Harry. Seria possível que Snape tivesse descoberto que os
meninos haviam lido sobre a Pedra Filosofal? Harry não imaginava como, no
entanto, por vezes tinha uma horrível sensação de que Snape podia ler
pensamentos.
Harry sabia que, quando lhe desejassem boa sorte à porta do vestiário na
tarde seguinte, Rony e Hermione estariam se perguntando se o veriam vivo outra
vez. Isto não era o que se poderia chamar de consolo. Harry mal ouviu uma
palavra da conversa de Olívio para animar os jogadores enquanto vestia
o uniforme de Quadribol e apanhava sua Nimbus 2000.
Entrementes, Rony e Hermione tinham encontrado um lugar nas
arquibancadas junto a Neville, que não conseguia entender por que eles estavam
tão sérios e tampouco por que haviam trazido as varinhas para o jogo. Mal sabia
Harry que Rony e Hermione tinham andado praticando secretamente o Feitiço das
Pernas Presas. Tinham tido essa idéia ao verem Draco usá-lo contra Neville e
estavam preparados para usá-lo contra Snape se ele desse o menor sinal de
querer machucar Harry.
— Agora não esqueça, é Locomotor Mortis — cochichou Hermione
enquanto Rony escondia a varinha na manga.
— Eu sei — Rony respondeu com maus modos. — Não chateia.
Mas no vestiário, Olívio puxara Harry para um lado.
— Não quero pressioná-lo, Potter, mas se há um dia em que precisamos
agarrar o pomo logo de saída é hoje. Termine o jogo antes que Snape possa
favorecer Lufa-Lufa demais.
— A escola inteira está lá fora! — disse Fred Weasley, espiando para fora
da porta. — Até mesmo, putz, Dumbledore veio assistir!
O coração de Harry deu um salto.
— Dumbledore? — disse, correndo até a porta para se certificar se Fred
tinha razão. Não havia como confundir aquela barba prateada.
Harry poderia ter dado uma grande gargalhada de alívio. Estava seguro.
Simplesmente não havia jeito de Snape ousar machucá-lo se Dumbledore
estivesse assistindo.
Talvez fosse por isso que Snape estava com a cara tão zangada na hora
em que os times entraram em campo, uma coisa em que Rony também reparou.
— Nunca vi Snape com uma cara tão feia — disse a Hermione.
— Olhe, começou. Ai!
Alguém cutucara Rony na cabeça. Era Draco.
— Ah, desculpe, Weasley, não vi você aí. — Draco deu um largo sorriso
para Crabbe e Goyle. — Quanto tempo será que Potter vai se agüentar na
vassoura desta vez? Alguém quer apostar? E você, Weasley?
Rony não respondeu, Snape acabara de achar uma penalidade na
Grifinória porque Jorge Weasley mandara um balaço nele.
Hermione, que mantinha todos os dedos cruzados no colo, apertava os
olhos fixos em Harry, que circulava sobre os jogadores como um falcão, à procura
do pomo.
— Sabe como eu acho que eles escolhem jogadores para o time da
Grifinória? — disse Draco bem alto alguns minutos depois, quando Snape aplicou
nova penalidade em Grifinória sem a menor razão. — Escolhem as pessoas que
dão pena. Vê só, o Potter, que não tem pais, depois os Weasley, que não tem
dinheiro. Você também devia estar no time, Longbottom, você não tem miolos.
Neville ficou muito vermelho, mas se virou para encarar Draco.
— Eu valho doze Dracos, Malfoy — gaguejou ele.
Draco, Crabbe e Goyle rolaram de rir, mas Rony, que continuava sem
coragem de despregar os olhos do jogo, disse:
— Isso mesmo, responda a ele, Neville.
— Longbottom, se miolos fossem ouro, você seria mais pobre do que
Weasley e isso já é muita coisa.
Os nervos de Rony já estavam esticados ao máximo de
tanta preocupação como Harry.
— Estou lhe avisando, Draco... Mais uma palavra...
— Rony! — disse Hermione de repente. — Harry!
— Quê? Onde?
Harry inesperadamente dera um mergulho espetacular, que provocou
exclamações e vivas da torcida. Hermione se levantou, os dedos cruzados na
boca, enquanto Harry voava para o chão como uma bala.
— Você está com sorte, Weasley, Potter com certeza localizou dinheiro no
chão! — disse Draco.
Rony reagiu. Antes que Draco soubesse o que estava acontecendo, Rony
partiu para cima dele e o derrubou no chão.
Neville hesitou, depois pulou o encosto da cadeira para ajudar.
— Vamos, Harry! — Hermione gritou, pulando em cima da cadeira para
observar Harry se precipitar na direção de Snape, ela nem sequer reparou que
Draco e Rony estavam embolados em baixo de sua cadeira, nem nos pés
arrastados e gritos que saiam do redemoinho de socos que era Neville, Crabbe e
Goyle.
No alto, Snape virou na vassoura bem em tempo de ver uma coisa
vermelha passar veloz por ele, deixando de atingi-lo por centímetros, e no
segundo seguinte, Harry saia do mergulho, o braço erguido em triunfo, o pomo
seguro na mão.
As arquibancadas explodiram, tinha que ser um recorde, ninguém era
capaz de lembrar do pomo ter sido agarrado tão depressa.
— Rony! Rony! Cadê você? A partida terminou! Harry ganhou! Nós
ganhamos! Grifinória está na frente! — gritava Hermione, dançando da cadeira
para o chão e dali para a cadeira e se abraçando com Parvati na fileira da frente.
Harry saltou da vassoura antes de chegar ao solo. Não conseguia
acreditar. Agarrara. O jogo terminou, nem chegara a durar cinco minutos. Quando
Grifinória invadiu o campo, ele viu Snape pousar ali perto, a cara branca e os
lábios contraídos, depois Harry sentiu uma mão no seu ombro, ergueu a cabeça
e deparou como rosto sorridente de Dumbledore.
— Muito bem — disse Dumbledore baixinho, de modo que somente Harry
pudesse ouvir. — Que bom ver que você não ficou pensando naquele espelho...
Manteve-se ocupado... Excelente...
Snape cuspiu com amargura no chão.
Harry deixou o vestiário sozinho algum tempo depois, para levar sua
Nimbus 2000 de volta à garagem. Não se lembrava de ter se sentido mais feliz.
Realmente fizera agora uma coisa de que poderia se orgulhar, ninguém poderia
mais dizer que ele era apenas um nome famoso. O ar da noite nunca lhe parecera
mais gostoso. Caminhou pela grama úmida, revivendo mentalmente a última hora,
que era um borrão de felicidade: Grifinória correndo para erguê-lo nos ombros,
Rony e Hermione a distância, pulando de alegria, Rony dando vivas como nariz
escorrendo sangue.
Harry chegara à garagem. Recostou-se na porta de madeira e contemplou
Hogwarts, com suas janelas avermelhadas pelo sol poente. Grifinória na liderança.
Ele conseguira, mostrara a Snape...
E por falar em Snape...
Uma figura encapuzada descia rapidamente os degraus de entrada do
castelo. Sem dúvida não queria ser vista, andava o mais depressa que podia em
direção à floresta proibida. A vitória de Harry se apagou de sua mente enquanto o
observava. Reconheceu o andar predador da figura. Snape, escapulindo até a
floresta enquanto todos jantavam, que estava acontecendo?
Harry tornou a montar a Nimbus 2000 e levantou vôo.
Planando silenciosamente sobre o castelo, viu Snape entrar na floresta
correndo. Seguiu-o.
As árvores eram tão juntas que ele não conseguia ver aonde fora Snape.
Voou em círculos cada vez mais baixos, roçando a copa das árvores até que ouviu
vozes. Planou em direção a elas e pousou, sem ruído, em uma alta bétula.
Subiu com cuidado em um dos ramos, segurando-se firme na vassoura,
tentando espiar por entre as folhas.
Embaixo, na clareira sombria, estava Snape, mas não estava sozinho.
Quirrell estava com ele. Harry não conseguiu distinguir a expressão no seu rosto,
mas a gagueira estava pior que nunca.
Harry apurou o ouvido para entender o que conversavam.
— ... Não sei por que você quis se encontrar logo aqui, Severo...
— Ah, quis manter o encontro sigiloso — disse Snape, a voz gélida. —
Afinal os alunos não devem saber sobre a Pedra Filosofal.
Harry se curvou para frente. Quirrell balbuciou alguma coisa.
Snape interrompeu-o.
— Você já descobriu como passar por aquela fera do Hagrid?
— M... M... Mas, Severo, eu...
— Você não quer que eu seja seu inimigo, Quirrell — ameaçou Snape,
dando um passo em direção a ele.
— N... N... Não seio que você...
— Você sabe perfeitamente o que quero dizer.
Uma coruja piou alto e Harry quase caiu da árvore. Firmou-se em tempo
de ouvir Snape dizer:
— ... As suas mágicas de araque. Estou esperando.
— M... Mas eu n... N... Não...
— Muito bem — interrompeu-o Snape. — Vamos ter outra conversinha em
breve, quando você tiver tido tempo de pensar nas coisas e decidir com quem está
a sua lealdade.
E jogando a capa por cima da cabeça saiu da clareira. Estava quase
escuro agora, mas Harry pôde discernir Quirrell, parado muito quieto como se
estivesse petrificado.
— Harry, onde é que você esteve? — perguntou Hermione com a voz
esganiçada.
— Vencemos! Você venceu! Nós vencemos! — gritou Rony, dando
palmadas nas costas de Harry — E deixei o olho de Draco roxo e Neville tentou
enfrentar Crabbe e Goyle sozinho! Ainda está desacordado, mas Madame
Pomfrey diz que ele vai ficar bom.
— Isso é que é mostrar a Sonserina! Todos estão esperando você na sala
comunal, estamos dando uma festa, Fred e Jorge roubaram uns bolos e outras
coisinhas nas cozinhas.
— Deixem isso para lá agora — disse Harry, sem fôlego. —
Vamos procurar uma sala vazia, esperem ate ouvirem isso...
Ele verificou se Pirraça não estava na sala antes de fechar a porta, depois
contou aos amigos o que vira e ouvira.
— Então tínhamos razão, é a Pedra Filosofal e Snape está tentando
obrigar Quirrell a ajudá-lo a roubar. Ele perguntou se o outro sabia como passar
por Fofo, e falou alguma coisa sobre as magiquinhas de Quirrell. Imagino que haja
outras coisas protegendo a pedra além de Fofo, uma porção de
feitiços, provavelmente, e Quirrell deve ter feito algum contra-feitiço de que Snape
precisa para entrar...
— Você quer dizer que a Pedra só está segura enquanto Quirrell resistir a
Snape? — perguntou Hermione alarmada.
— Terça-feira ela terá desaparecido — disse Rony.

CAPÍTULO CATORZE
Norberto, O Dragão Norueguês

Quirrell, no entanto, deve ter sido muito mais corajoso do que eles
pensaram. Nas semanas seguintes ele pareceu estar ficando mais pálido e mais
magro, mas não parecia ter cedido.
Todas as vezes que os meninos passavam pelo corredor do terceiro
andar, Harry, Rony e Hermione encostavam as orelhas na porta para verificar se
Fofo continuava a rosnar lá dentro. Snape levava a vida no seu habitual mau
humor, o que com certeza significava que a Pedra continuava a salvo. Sempre
que Harry passava por Quirrell nesses últimos dias dava-lhe um sorriso como a
encorajá-lo, e Rony começara a censurar as pessoas que riam da gagueira de
Quirrell.
Hermione, no entanto, tinha mais no que pensar do que na Pedra Filosofal
Começara a programar suas revisões e a marcar em cores suas anotações de
aula para classificá-las. Harry e Rony não teriam se importado com isso, mas ela
não parava de chateá-los para fazerem o mesmo.
— Hermione, os exames estão a séculos de distância.
— Dez semanas — retorquiu Hermione. — Não são séculos, é como um
segundo para Nicolau Flamel.
— Mas nós não temos seiscentos anos — lembrou-lhe Rony. Em todo o
caso, o que é que você está revisando se já sabe tudo?
— Que é que estou revisando? Vocês ficaram malucos? Vocês
já perceberam que precisamos passar nesses exames para chegar ao segundo
ano? Eles são muito importantes, eu deveria ter começado a estudar a um mês,
não sei o que deu em mim...
Infelizmente, os professores pareciam estar pensando da mesma maneira
que Hermione. Passaram tantos deveres de casa que as férias da Páscoa não
foram tão divertidas quanto as de Natal. Ficou difícil se descontrair com Hermione
ao lado, recitando os doze usos do sangue de dragão ou praticando movimentos
com a varinha. Aos gemidos e bocejos, Harry e Rony passaram a maior parte do
tempo livre com ela, na biblioteca, tentando dar conta de todos os deveres extras.
— Eu nunca vou me lembrar disso — desabafou Rony uma
tarde, largando a pena de escrever na mesa e olhando desejoso pela janela da
biblioteca. Era na realidade o primeiro dia bonito que tinham em meses. O céu
estava claro, azul-miosótis e havia uma expectativa de verão no ar.
Harry, que estava procurando o verbete "Ditamno" no livro de Cem ervas e
fungos mágicos, não levantou os olhos até a hora em que ouviu Rony exclamar:
— Rúbeo! Que é que você está fazendo na biblioteca?
Hagrid veio arrastando os pés, escondendo alguma coisa às costas.
Parecia muito deslocado com o seu casaco de pêlo de toupeira.
— Só olhando — disse numa voz insegura que imediatamente despertou
o interesse deles. — E o que é que vocês estão armando? — Ele pareceu
repentinamente desconfiado. — Não continuam procurando o Nicolau Flamel,
continuam?
— Ah, já descobrimos quem ele é há séculos — disse Rony
para impressionar. — E você sabe o que é que aquele cachorro está guardando, é
a Pedra Filo...
— Chhhhi! — Hagrid olhou à sua volta depressa para ver se alguém
estava escutando. — Não saiam gritando isso por ai, que foi que deu em vocês?
— Mas, tem umas coisinhas que queríamos perguntar a você. — disse
Harry — sobre as outras coisas que estão protegendo a Pedra além do Fofo...
— CHHHHHI! — fez Hagrid de novo. — Escutem, venham me ver mais
tarde, não estou prometendo que vou lhes dizer nada, vejam bem, mas não saiam
dando com a língua nos dentes por ai, estudantes não devem saber disso. Vão
achar que fui eu que contei a vocês...
— Vemos você mais tarde, então — concordou Harry.
Hagrid saiu arrastando os pés.
— Que é que ele estava escondendo às costas? — perguntou Hermione
pensativa.
— Acham que tinha alguma coisa a ver com a Pedra?
— Vou ver em que seção ele estava — prontificou-se Rony, que já estava
farto de trabalhar. Voltou um minuto depois com uma braçada de livros e largou-os
em cima da mesa.
— Dragões — cochichou — Rúbeo estava procurando coisas
sobre dragões! Olhem só estes: Espécies de dragões da Grã-Bretanha e da
Irlanda, Do ovo ao inferno, guia do guardador de dragões.
— Rúbeo sempre quis um dragão, ele me disse isso da primeira vez em
que nos vimos — comentou Harry.
— Mas é contra as nossas leis — argumentou Rony. — Criar dragões foi
proibido pela Convenção dos Bruxos de 1709, todo o mundo sabe disso. É difícil
evitar que os trouxas reparem em nós se criarmos dragões no quintal. Em todo o
caso, não se pode domesticar dragões, é perigoso. Vocês deviam ver as
queimaduras que Carlinhos recebeu de dragões selvagens na Romênia.
— Mas não tem dragões selvagens na Grã-Bretanha? — perguntou Harry.
— Claro que tem — respondeu Rony — Os dragões verdes galeses e os
negros das ilhas Hébridas. O Ministério da Magia tem um bocado de trabalho para
mantê-los em segredo, posso lhe garantir. O nosso povo vive enfeitiçando trouxas
que os viram, para fazê-los esquecer.
— Então o que será que Rúbeo anda armando? — perguntou Hermione.
Quando eles bateram á porta da cabana do guarda-caça uma hora mais
tarde, ficaram surpresos de ver que todas as cortinas estavam fechadas. Hagrid
perguntou "Quem é?" antes de deixá-los entrar e em seguida fechou depressa a
porta assim que eles entraram.
Estava um calor sufocante no interior da cabana. E embora fosse um dia
bem quente havia um fogaréu na lareira. Hagrid preparou chá para os meninos e
lhes ofereceu sanduíches de carne de arminho, que eles recusaram.
— Então, vocês queriam me perguntar uma coisa?
— Queríamos — disse Harry. Não havia sentido em perder tempo com
rodeios. — Estivemos pensando se você poderia nos dizer o que mais está
protegendo a Pedra Filosofal além de Fofo.
Hagrid amarrou a cara.
— Claro que não posso dizer. Primeiro, eu mesmo não sei. Segundo
vocês já sabem demais, de modo que eu não diria a vocês se soubesse. Aquela
Pedra está aqui por uma boa razão. Quase foi roubada de Gringotes. Suponho
que vocês já chegaram a essa conclusão. Fico até espantado que saibam da
existência de Fofo.
— Ah, vamos Rúbeo, talvez você não queira nos dizei, mas você sabe
tudo o que acontece por aqui — disse Hermione num tom caloroso e lisonjeiro. A
barba de Hagrid mexeu e eles perceberam que estava sorrindo. — Só estávamos
querendo saber realmente quem fez o feitiço de proteção — continuou Hermione.
— Estávamos querendo saber em quem Dumbledore teria confiado o
suficiente para ajudá-lo, além de você.
O peito de Rúbeo se estufou ao ouvir essas palavras. Harry e Rony se
abriram em sorrisos para Hermione.
— Bom, acho que não poderia fazer mal contar isso... Vamos ver.. Ele
pediu Fofo emprestado a mim... Depois alguns professores fizeram os feitiços... A
Professora Sprout.. O Professor Flitwick... A Professora Minerva... — ele foi
contando nos dedos — o Professor Quirrell... E o próprio Dumbledore também fez
alguma coisa, é claro. Um momento esqueci alguém. Ah, sim, o Professor Snape.
— Snape?
— É, vocês não continuam insistindo naquela idéia, ou continuam? Olhem,
Snape ajudou a proteger a Pedra, não está prestes a roubá-la.
Harry sabia que Rony e Hermione estavam pensando o mesmo que ele.
Se Snape fora chamado para proteger a Pedra, devia ter sido fácil descobrir como
os outros professores a tinham protegido. Ele provavelmente sabia de tudo,
exceto, ao que parecia, o feitiço que Quirrell fizera e de que jeito passar por Fofo.
— Você é o único que sabe como passar pelo Fofo, não e, Rúbeo? —
Harry perguntou, ansioso. — E você não diria a ninguém, não é? Nem mesmo a
um dos professores?
— Ninguém sabe a não ser eu e Dumbledore — disse Hagrid orgulhoso.
— Bom, isso já é alguma coisa — murmurou Harry para os outros. —
Rúbeo, podemos abrir uma janela? Estou assando.
— Não pode, desculpe Harry — disse Hagrid. Harry notou que ele olhava
para o fogo. Harry olhou também.
— Rúbeo, o que é isso?
Mas ele já sabia o que era. Bem no meio do fogo, debaixo da chaleira,
havia um enorme ovo negro.
— Ah — respondeu Hagrid, mexendo, nervoso, na barba. — É... Ah...
— Onde foi que você arranjou isso, Rúbeo? — perguntou
Rony, abaixando-se para o fogo para olhar o ovo mais de perto. — Isso deve terlhe
custado uma fortuna.
— Ganhei. A noite passada. Eu estava na vila tomando uns tragos e entrei
num joguinho de cartas com um estranho. Acho que ele ficou bem contente de se
livrar do ovo, para ser sincero.
— Mas o que é que você vai fazer com ele, quando chocar? — perguntou
Hermione.
— Bom, andei lendo um pouco — disse Hagrid, tirando um grande livro de
baixo do travesseiro. — Apanhei este na biblioteca:
A criação de dragões como prazer e fonte de renda. É meio desatualizado,
é claro, mas está tudo aqui. Mantenha o ovo no fogo porque as mães sopram fogo
em cima deles, sabe, e quando chocar dê-lhe um balde de conhaque misturado
com sangue de galinha a cada meia hora. E vejam aqui: como reconhecer
os diferentes ovos, e este aqui é um dragão norueguês. São raros esses.
Ele parecia muito satisfeito consigo mesmo, mas Hermione não.
— Rúbeo, você mora numa cabana de madeira — lembrou-lhe.
Mas Hagrid nem escutou. Estava cantarolando alegremente enquanto
atiçava o fogo.
Então agora tinham mais uma coisa com que se preocupar: o que poderia
acontecer a Hagrid se alguém descobrisse que estava escondendo um dragão
ilegal em sua cabana.
— Como será ter uma vida tranqüila — suspirou Rony, pois noite após
noite eles lutavam para dar conta de todos aqueles deveres de casa
suplementares que estavam recebendo. Hermione agora começava a programar
as revisões de Harry e Rony também.
Estava deixando os dois malucos.
Então, certo dia ao café da manhã, Edwiges trouxe outro bilhete de Hagrid
para Harry. Ele escrevera apenas duas palavras.
“Está furando”.
Rony queria faltar à Herbologia e ir direto à cabana. Hermione nem quis
ouvir falar nisso.
— Hermione, quantas vezes na vida vamos ver um dragão saindo do ovo?
— Temos aulas, vamos nos meter em confusão, e isso não vai ser nada
comparado à situação de Rúbeo quando descobrirem o que ele anda fazendo.
— Cala a boca! — cochichou Harry.
Malfoy estava a apenas alguns passos e parou instantaneamente para
ouvir. Quanto teria ouvido? Harry não gostou nem um pouco da expressão que viu
na cara de Malfoy.
Rony e Hermione discutiram todo o tempo a caminho da aula de
Herbologia e, no final, Hermione concordou em dar uma corrida à casa de Hagrid
com os dois no intervalo da manhã.
Quando a sineta tocou no castelo anunciando o fim da aula, os
três largaram as colheres de jardineiro e atravessaram a propriedade correndo em
direção à orla da floresta. Hagrid cumprimentou-os parecendo vermelho e
excitado.
— Está quase furando. — Conduziu-os para dentro.
O ovo estava em cima da mesa. Tinha fundas rachaduras.
Alguma coisa se mexia dentro dele, fazia um barulhinho engraçado.
Todos puxaram as cadeiras para junto da mesa e observaram com a
respiração presa.
De repente ouviram um som arranhado e o ovo se abriu. O dragão-bebê
caiu molemente em cima da mesa. Não era exatamente bonito, Harry achou que
parecia um guarda-chuva preto amassado. As asas espinhosas eram enormes em
contraste como corpo preto e magro, tinha um focinho longo com narinas largas,
tocos de chifres e olhos esbugalhados cor de laranja.
Espirrou. Voaram fagulhas do seu focinho.
— Ele não é lindo? — murmurou Hagrid. Esticou a mão para afagar a
cabeça do dragão. O bicho tentou morder seus dedos, deixando à mostra presas
pontiagudas.
— Deus o abençoe, olhe, ele conhece a mamãe! — exclamou Hagrid.
— Rúbeo — perguntou Hermione —, exatamente com que rapidez um
dragão norueguês cresce?
Hagrid ia responder quando a cor subitamente desapareceu do seu rosto,
ele deu um salto e correu à janela.
— Que foi?
— Alguém estava espiando pela fresta nas cortinas, um garoto estava
correndo de volta para a escola.
Harry se precipitou para a porta e espiou para fora. Mesmo a distância não
havia como se enganar.
Malfoy vira o dragão.
Alguma coisa no sorriso que rondou a cara de Malfoy durante a semana
seguinte deixou Harry, Rony e Hermione muito nervosos. Passaram a maior parte
do tempo livre na cabana sombria de Hagrid, tentando argumentar com ele.
— Deixe o dragão ir embora — insistia Harry — Solte ele.
— Não posso — disse Hagrid. — Ele é muito pequeno. Morreria.
Eles olharam para o dragão. Aumentara três vezes de comprimento em
uma semana. A fumaça não parava de sair de suas narinas. Hagrid não estava
cumprindo suas tarefas de guarda-caça porque o dragão o mantinha muito
ocupado. Havia garrafas vazias de conhaque e penas de galinha por todo o chão.
— Decidi chamá-lo de Norberto — anunciou Hagrid, olhando para o
dragão com olhos sonhadores. — Ele realmente sabe quem eu sou, olhem.
Norberto! Norberto! Onde está a mamãe?
— Ele pirou — cochichou Rony na orelha de Harry.
— Rúbeo — disse Harry em voz alta —, dê mais quinze dias e Norberto
vai ficar do tamanho de sua casa. Malfoy pode procurar Dumbledore a qualquer
momento.
Hagrid mordeu o lábio.
— Eu... Eu sei que não vou poder ficar com ele para sempre, mas também
não posso largá-lo assim, não posso.
Harry de repente virou-se para Rony.
— Carlinhos — falou.
— Você também — respondeu Rony. — Eu sou Rony, está lembrado?
— Não, Carlinhos... Seu irmão, Carlinhos. Na Romênia. Estudando
dragões. Poderíamos mandar Norberto para ele. Carlinhos pode cuidar dele e
depois devolvê-lo à floresta!
— Brilhante! — exclamou Rony. — Que é que você acha Rúbeo?
E no fim, Hagrid concordou que podiam mandar uma coruja a Carlinhos
para consultá-lo.
A semana seguinte se arrastou. A noite de quarta-feira encontrou
Hermione e Harry sentados sozinhos na sala comunal, muito depois de todos
terem ido se deitar. O relógio na parede acabara de bater meia-noite quando o
buraco do retrato se abriu de repente. Rony se materializou ao tirar a capa da
invisibilidade de Harry. Estivera na cabana de Hagrid, ajudando a
alimentar Norberto, agora comendo caixotes de ratos mortos.
— Ele me mordeu! — disse ele mostrando a mão, que trazia enrolada em
um lenço ensangüentado. — Não vou conseguir segurar a pena de escrever
durante uma semana. Vou lhe contar, aquele dragão é o bicho mais horrível que
conheci, mas quem ouve Rúbeo falar pensa que ele é um coelhinho fofo. Quando
o dragão me mordeu, ele ralhou comigo por tê-lo assustado. E quando sai, estava
cantando uma canção de ninar.
Ouviu-se uma batida na janela escura.
— É a Edwiges! — disse Harry, correndo para deixá-la entrar — Deve
estar trazendo a resposta de Carlinhos!
Os três juntaram as cabeças para ler o bilhete.
Caro Rony,
Como vai? Obrigado pela carta, terei prazer em cuidar
do dragão norueguês, mas não será fácil mandá-lo para mim.
Acho que o melhor será mandá-lo por alguns amigos que estão vindo
me visitar na próxima semana. O problema é que eles não podem ser
vistos carregando um dragão ilegal.
Você poderia levar o dragão para a torre mais alta à meianoite
de sábado? Eles podem se encontrar com você lá e leválo
enquanto ainda está escuro.
Mande-me uma resposta o mais breve possível.
Afetuosamente,
Carlinhos.
Eles se entreolharam.
— Temos a capa da invisibilidade — disse Harry — Não deve ser muito
difícil. Acho que a capa é bastante grande para cobrir dois de nós e o Norberto.
O fato de os outros dois concordarem indicava como a semana fora ruim,
Qualquer coisa para se livrarem de Norberto e de Malfoy.
Mas houve um imprevisto. Na manhã seguinte, a mordida do dragão fizera
a mão de Rony inchar, ficando duas vezes o seu tamanho normal. Ele não sabia
se era seguro procurar Madame Pomfrey, será que ela reconheceria uma mordida
de dragão? À tarde, porém, não houve mais jeito. O corte adquirira uma feia
cor verde. Dava a impressão de que as presas de Norberto eram venenosas.
Harry e Hermione correram para a ala do hospital no fim do dia e
encontraram Rony acamado numa situação horrível.
— Não é só a minha mão — cochichou ele — embora ela pareça que vai
cair. Malfoy disse à Madame Pomfrey que queria pedir emprestado um livro meu,
para poder vir dar uma boa gargalhada. Ficou ameaçando contar a ela o que
realmente me mordera. Eu disse que foi um cachorro, mas acho que ela não está
acreditando. Eu não devia ter batido nele no jogo de Quadribol, é por isso que ele
está agindo assim.
Harry e Hermione tentaram acalmar Rony.
— Tudo vai terminar à meia-noite de sábado — disse Hermione, mas isso
não acalmou Rony nem um pouquinho. Pelo contrário, ele se sentou muito
empertigado e desatou a suar.
— Meia-noite de sábado! — disse com a voz rouca — Ah, não... Ah, não...
Acabei de me lembrar, a carta de Carlinhos estava no livro que Malfoy levou, ele
vai saber que vamos nos livrar de Norberto.
Harry e Hermione não tiveram nem chance de responder. Madame
Pomfrey apareceu naquele instante e fez os dois saírem, dizendo que Rony
precisava dormir.
— Agora é tarde demais para mudarmos de plano. Não temos mais tempo
para mandar outra coruja a Carlinhos e essa pode ser a nossa única oportunidade
de nos livrarmos de Norberto. Teremos de arriscar. E temos a capa da
invisibilidade, Malfoy não sabe disso.
Eles encontraram Canino, o cão de caçar javalis, sentado do lado de fora
da cabana com a cauda enfaixada, quando foram contar a Hagrid, que abriu a
janela para falar com eles.
— Não vou deixar vocês entrarem — ofegou. — Norberto está passando
uma fase difícil, nada que eu não possa cuidar sozinho.
Quando lhe contaram sobre a carta de Carlinhos, seus olhos se encheram
de lágrimas, embora isso talvez fosse porque Norberto acabara de mordê-lo na
perna.
— Aai! Tudo bem, ele só mordeu minha bota. Está brincando, afinal é um
bebezinho.
O bebê bateu com o rabo na parede, fazendo as janelas estremecerem.
Harry e Hermione voltaram para o castelo achando que o sábado talvez não
chegasse bastante rápido.
Eles teriam sentido pena de Hagrid quando chegou a hora de dizer adeus
a Norberto, se não estivessem tão preocupados com o que tinham de fazer. Era
uma noite muito escura e anuviada e se atrasaram um pouco para chegar à
cabana de Hagrid porque precisaram esperar Pirraça desimpedir o caminho para o
saguão de Entrada, onde estivera jogando tênis contra a parede.
Hagrid aprontara Norberto embalando-o num grande caixote.
— Pus muitos ratos e um pouco de conhaque para a viagem — disse
Hagrid com a voz abafada. — E embalei junto o ursinho de pelúcia para o caso de
ele se sentir solitário.
De dentro do caixote vinha um ruído de pano rasgado que pareceu a
Harry ser o dragão arrancando a cabeça do ursinho.
— Até a vista, Norberto! — soluçou Hagrid, quando Harry e Hermione
cobriram o caixote com a capa da invisibilidade e entraram debaixo dela. —
Mamãe nunca vai esquecer você!
Como foi que conseguiu levar o caixote de volta ao castelo, eles nunca
souberam. Aproximava-se a meia-noite e eles subiram com Norberto pela
escadaria do saguão de entrada e pelos corredores escuros. Mais uma escada,
mais outra, nem mesmo um dos atalhos de Harry facilitou muito o transporte.
— Estamos quase lá! — Harry ofegou quando chegaram ao corredor sob
a torre mais alta.
Então um movimento brusco à frente deles quase fez com que deixassem
cair o caixote. Esquecendo que já estavam invisíveis, encolheram-se nas
sombras, espiando os contornos escuros de duas pessoas que se debatiam a uns
três metros. Uma lâmpada se acendeu.
A Professora Minerva, num robe de lã escocesa e rede no
cabelo, segurava Malfoy pela orelha.
— Está detido — gritou. — E são vinte pontos a menos para Sonserina.
Perambulando no meio da noite, como você se atreve...
— A senhora não compreende, professora, Harry Potter está vindo aí, vem
trazendo um dragão.
— Que absurdo! Como você se atreve a contar tais mentiras! Vamos, vou
conversar com o Professor Snape sobre você, Malfoy!
A íngreme escada em espiral até o alto da torre pareceu a coisa mais fácil
do mundo depois disto. Somente quando saíram para o ar frio da noite foi que se
livraram da capa da invisibilidade, felizes de poderem respirar direito outra vez.
Hermione dançou uma espécie de jiga escocesa.
— Malfoy vai ficar detido! Eu seria capaz de cantar.
— Não cante — aconselhou Harry.
Rindo de Malfoy, eles esperaram, enquanto Norberto se debatia dentro do
caixote. Passados uns dez minutos, quatro vassouras surgiram da escuridão
mergulhando em direção à torre.
Os amigos de Carlinhos formavam um grupo animado.
Mostraram a Harry e a Hermione os arreios que tinham trazido de modo a
poder suspender Norberto entre eles. Todos ajudaram a prender Norberto muito
bem nos arreios e então Harry e Hermione apertaram as mãos de todos e lhes
agradeceram muito.
Finamente Norberto estava indo... Indo... E finalmente se foi.
Eles desceram a escada espiral sem fazer barulho, os corações leves
como as mãos, agora que Norberto fora tirado delas. Nada de dragão, Malfoy
detido, o que poderia estragar essa felicidade?
A resposta à sua pergunta estava esperando ao pé da escada.
Quando chegaram ao corredor, a cara de Filch assombrou-os, emergindo
da escuridão.
— Ora, ora, ora — sussurrou —, estamos encrencados.
Tinham deixado a capa da invisibilidade no alto da torre.

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